São Paulo, terça-feira, 16 de agosto de 1994
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Na cola do real

Se o mandato de Itamar Franco terminasse agora, ocorreria uma dessas formidáveis ironias da história. Em um país em que apenas um presidente democraticamente eleito, em meio século, conseguiu terminar o mandato (Juscelino Kubitschek, em 1961), Itamar, apesar de não ter sido ele próprio o escolhido para exercer a Presidência, completaria seu período dono de uma popularidade invejável.
É o que revela a mais recente pesquisa do Datafolha que avalia a gestão do presidente. Itamar consegue 37% de ótimo/bom e ainda fica com 46% de regular, porcentagens excelentes, ainda mais na comparação com o passado recentíssimo.
Até a pesquisa anterior, em maio, Itamar estava em situação exatamente oposta. A maioria relativa, como agora, considerava-o regular (43%), mas o número dos que cravavam ruim/péssimo para o presidente (38%) mais do que duplicava o de ótimo/bom (16%).
Para um presidente que andou lançando um balão de ensaio sobre a antecipação da eleição, no ano passado, sintoma de sua impopularidade, os resultados agora alcançados tornam-se até mesmo excepcionais. Em pouquíssimo tempo, Itamar deixou de ser um presidente candidato a renunciar para se transformar em candidato a voltar a ser presidente, em 1998.
Parece evidente que Itamar deve sua popularidade a uma única obra, a estabilização da economia. Uma estabilização de resto provisória, como o admite até o atual ministro da Fazenda, Rubens Ricupero.
A ironia torna-se ainda mais gritante quando se sabe que Itamar, a rigor, deu pequena contribuição pessoal para o plano de estabilização. Foi elaborado pela equipe técnica da Fazenda e apresentado ao presidente no fim-de-semana que antecedeu o lançamento da URV, em fevereiro.
Essa mudança enorme na avaliação do presidente permite constatar que o cansaço da sociedade com a inflação é tão formidável que basta estancá-la para que o governante dê saltos em popularidade que antes pareciam impensáveis.
Todos os demais problemas continuam de pé e do mesmo tamanho. Tamanho, aliás, enorme. Mesmo assim, o presidente recuperou a estima de uma parcela substancial da população. Sinal claro de que a inflação era uma fogueira que devorava não apenas o valor da moeda, mas também a popularidade dos governantes de turno.

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