São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994
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Déficit é desafio para novo presidente

GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Se o próximo presidente não conseguir que o Congresso aprove reformas na Constituição já no seu primeiro ano de mandato, o governo deverá registrar um déficit na casa dos US$ 20 bilhões nas contas de 1996.
Este seria o rombo estimado para este ano e o próximo, caso não tivesse sido criado o FSE (Fundo Social de Emergência), por emenda constitucional que perde seus efeitos em 1996.
Para cada gasto acima da arrecadação, o governo será obrigado a tomar dinheiro emprestado de bancos, vendendo títulos no mercado e alimentando a ciranda financeira e a inflação.
Não é apenas uma tese de burocratas do governo. Todos os presidenciáveis disseram à Folha pretender reformar a Constituição para garantir o equilíbrio das contas.
Obter aprovação para mudanças no texto constitucional não é tarefa fácil. São necessários três quintos dos votos na Câmara e no Senado, em votações em dois turnos nas duas casas.
Até hoje, somente quatro alterações foram feitas na Carta. Desta conta estão excluídas as alterações feitas na extinta revisão constitucional, que puderam ser obtidas com maioria simples.
"A estrutura de gastos imposta pela Constituição faz com que menos de 10% dos recursos do governo possam ser gastos livremente", avalia o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Raul Jungmann.
Ele aponta duas causas estruturais para o déficit orçamentário: o sistema de impostos, que gera uma arrecadação inferior às despesas mínimas, e a concentração de gastos imposta ao governo.
Há 12 anos o governo tenta equacionar o déficit em suas contas, incluídos os desempenhos de Estados e municípios. Neste período, houve agravamento da inflação e a economia parou de crescer.
Os problemas se intensificaram a partir de 1982, quando os países subdesenvolvidos concluíram não serem capazes de cumprir os pagamentos de suas dívidas externas.
Até então, grande parte do que o governo brasileiro gastava além da arrecadação era financiada com recursos externos, que secaram depois da crise da dívida.
Como isso significou uma espécie de "falência" do Estado, o governo deixou de ter credibilidade para obter dinheiro emprestado, tanto lá fora como do sistema financeiro interno.
Hoje, por exemplo, a maior parte dos US$ 55 bilhões em títulos da dívida interna brasileira tem que ser renovada a cada 28 dias. Os Estados Unidos se endividam em prazos superiores a 30 anos.
Por isso, a maioria dos economistas concorda que não é propriamente o déficit brasileiro o grande causador da inflação, mas sim suas condições de financiamento.
O déficit brasileiro é pequeno se comparado à riqueza do país. Em 1993, por exemplo, ele representou 0,4% do PIB (Produto Interno Bruto, soma dos bens e serviços produzidos no país).
No mesmo ano, o Japão teve déficit de 0,6% do PIB, os EUA de 4,5% e a Itália de 10%.
Quando o governo é obrigado a vender títulos de curtíssimo prazo e a juros altos, permite que os bancos ofereçam a seus clientes aplicações financeiras em condições semelhantes.
O dinheiro da economia é transferido para estas aplicações, mais lucrativas que a atividade produtiva. Diminuem os investimentos e a oferta de bens à população, fazendo com que os preços subam.

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