São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994
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Marta Suplicy quer discutir no Congresso ações contra a AIDS

CLÓVIS ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

A sexóloga Marta Suplicy inscreve o tema Aids como prioridade número um de sua primeira candidatura a cargo eletivo (deputada federal) pelo PT-SP.
Não é exatamente um tema fácil e corriqueiro, mas a intenção da candidata é "tornar mais forte no Congresso" a discussão em torno da Aids.
As outras prioridades são as que têm marcado a atuação dessa mulher de 49 anos, polêmica desde que começou a falar de educação sexual na TV, em época de menor abertura para esse tipo de assunto.
Casada com um senador paulista Eduardo Suplicy, também do PT, mãe de um roqueiro, o Supla, Marta decidiu candidatar-se agora porque acha que já vinha tendo, por meio de seus artigos e conferências, uma atuação nitidamente política, embora como cidadã comum.
A sexólogo petista acredita que as posições que sempre defendeu ganharão peso se repetidas da tribuna da Câmara.
Os principais pontos da entrevista de Marta Suplicy à Folha, concedida na tarde de sexta-feira, são os seguintes:

Folha - Se a senhora fosse obrigada a apresentar, no primeiro dia na Câmara, um projeto e um só projeto, qual seria?
Marta - Tenho um assunto que é prioritário: a questão da Aids. O que faço nos artigos que escrevo posso fazer no Congresso, inclusive avaliando criticamente as posições que estão sendo tomadas pelo governo, mas tendo um peso muito maior do que como cidadã.
Eu pretendo me pronunciar sobre as questões nacionais, o que, muitas vezes, tem mais força até do que um projeto de lei.
Vou ter também a preocupação de dialogar com o Executivo para ampliar a força desses programas.
Folha - Mesmo que o Executivo seja de outro partido?
Marta - Eu sempre dialoguei muito bem com todos os partidos.
Folha - Que outras prioridades marcarão sua atuação?
Marta - Pretendo ser a voz dos meus representados. Os projetos de lei virão em decorrência disso.
Folha - Uma das queixas que se ouve frequentemente a respeito dos parlamentares é a dificuldade de contato entre os representados e seus representantes...
Marta - Eu tenho um exemplo muito bom na minha própria casa. O Eduardo nunca tirou o telefone da lista. Eu acho interessante poder ouvir o eleitor.
Gostaria que as pessoas que votarem em mim mantivessem comigo esse canal aberto. Que as pessoas escrevam, se manifestem, digam se estou atendendo às expectativas que tinham.
Quero tratar também de orientação sexual na escola. Ou a questão de melhor capacitação de professores. Gostaria de ver a possibilidade de você atrelar uma parte do Orçamento que vem para os Estados ao salário do professor e à sua capacitação. Outra prioridade é a questão do trabalho da mulher. Ela ainda tem ainda um salário defasado em relação ao do homem.
Folha - A senhora falou em ouvir o eleitor. Não acha que isso passa por uma reforma eleitoral de forma a implantar o voto distrital, por exemplo?
Marta - Eu gosto mais do voto proporcional (sistema atualmente vigente em que o candidato recolhe votos em todo o Estado e não apenas em um dado distrito). Eu vou ter votos em São Paulo inteiro em função do meu trabalho. Se eu fosse uma candidata do Jardim Europa apenas, talvez não fosse eleita. O voto proporcional permite às candidaturas mais avançadas a possibiidade de se eleger.
Folha - Na questão econômica, a senhora vai trabalhar para a sustentação do Plano Real?
Marta - Em janeiro, a moeda já terá dado certo ou estará fazendo água por todos os lados. Se a inflação estiver sob controle, todas as medidas devem ser tomadas para que ela seja debelada para sempre, porque é o grande horror do povo brasileiro e o meu.
Não dá para esquecer que houve um enorme aumento de preços na virada da moeda, e os salários não obtiveram esse aumento. Não vejo nada nesse plano que fale em distribuição de renda ou em erradicação da miséria. Acho que aí há uma grande diferença entre a candidatura Lula e o Fernando Henrique.
Folha - O que acha da hipótese de se convocar uma Assembléia Revisora exclusiva?
Marta - Acho interessante, mas tenho de pensar mais em como vai ser a representação nessa assembléia. Tenho de ter certeza de que todos os segmentos poderão estar representados e com a mesma força. Eu não vejo totalmente claro se isso é possível.
Em relação à revisão, há uma coisa importante: foram obtidas conquistas na Constituição de 88 em relação à mulher. A primeira coisa, então, é lutar para que os direitos conquistados não sejam eliminados.
Folha - O Fernando Henrique não descarta contar com gente do PT...
Marta - Eu li isso hoje (sexta-feira) e acho que é uma atitude bem eleitoreira. Parece muito mais um canto de sereia para os petistas do que outra coisa.
Folha - Mas, na hipótese de ele vencer e convidá-la para trabalhar numa área de sua especialidade, a senhoria aceitaria?
Marta - Eu teria de sentar com o meu partido para discutir. Não faria isso individualmente.
Folha - A imagem dos políticos parece estar hoje no seu ponto mais baixo. Qual é a causa, na sua opinião, e como fazer para corrigir o problema?
Marta - Chegou-se a essa situação pelo fato de a imprensa divulgar continuamente corrupção dos políticos e as pessoas perceberem que é assim mesmo.
Sentem-se absolutamente impotentes para lidar com essa situação ao verem todos os serviços a que têm direito, pelos impostos que pagam, serem de péssima qualidade, e os políticos se beneficiando.
O político tem de ter um comportamento ético e digno para que as pessoas restaurem a sua confiança no político.

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