São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994
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Um livro vivo

DA REDAÇÃO

Um livro vivo
Em 1954, o poeta João Cabral de Melo Neto escreveu para o jornal "A Vanguarda" um texto sobre "A Luta Corporal", de Ferreira Gullar. É desse texto que Mais! publica um trecho abaixo.
"A Vanguarda" foi fundado pelo próprio Cabral em parceria com o jornalista e historiador Joel Silveira. Na época, o poeta estava afastado do Itamaraty em consequência da acusação de exercer atividade comunista, feita contra ele por Carlos Lacerda. "A Vanguarda" foi uma aventura que durou cinco meses apenas.

JOÃO CABRAL DE MELO NETO

O livro "A Luta Corporal", com que estréia o jovem poeta Ferreira Gullar, mostra uma justa compreensão do que é a arte da tipografia. Impresso em papel absolutamente pobre, sem nenhum desses adornos provincianos ainda tão usados entre nós para dar caráter de luxo a uma impressão cara, o livro é um dos trabalhos gráficos mais simpáticos publicados ultimamente (...).
Não sei se é ao sr. Ferreira Gullar ou ao seu editor que se deve lançar o crédito por esse exemplo de bom uso dos meios da tipografia. Talvez seja à própria experiência poética do sr. Ferreira Gullar e ao fato de que, em suas pesquisas com a palavra e com o verso, a disposição de pretos e brancos desempenha papel essencial. Como quer que seja, cabe o registro desse bom exemplo de livro vivo, ajustado e servindo a seu texto sem nada do simples depósito de poemas que vemos correntemente.
Não é só para experiências do tipo da do sr. Ferreira Gullar, tão ligadas à matéria da palavra, ou para experiências ligadas ao aspecto plástico dos poemas, como a dos "Calligrammes" de Appolinaire, que o objeto livro tem que ser levado em conta. Também não é só em experiências como a do "Un Coup de dés..." de Mallarmé, em que o jogo de elementos tipográficos é fonte de poesia, que a necessidade aparece de se explorar recursos puramente gráficos.
O livro, principalmente o livro de poesia, mesmo quando o autor não procure impor leis especiais à leitura do verso, tem de estar subordinado ao texto: deve, quando nada, não pesar sobre o texto, com todos os adornos e ilustrações que, em geral, vemos associados à idéia de edição de luxo.

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