São Paulo, domingo, 28 de agosto de 1994
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Constitução é vitória política de Menem

MATINAS SUZUKI JR.
ENVIADO ESPECIAL A BUENOS AIRES

O presidente argentino Carlos Menem comemorou esta semana uma vitória que poderá decidir o futuro político da Argentina até as vésperas do ano 2.000.
Em primeiro lugar, ele conseguiu incluir no texto da reforma da Costituição da Argentina, promulgada na última quinta-feira, o direito à sua reeleição.
Agora, só um fato político de proporções inimagináveis poderá afastá-lo das eleições presidenciais de 14 de maio de 1995.
Mas, quase tão importante quanto a conquista do seu direito de reeleição, foi o arranjo político para se chegar ao novo texto da constituição da Argentina.
Em jogada de extrema habilidade, Menem conseguiu uma espécie de "pacto político": um congresso revisor exclusivo ratificou por unanimidade a Carta Magna.
Para se ter uma idéia do arco político deste acordo, aprovaram a reforma constitucional –não por acaso, presidida pelo irmão do próprio Menem, Eduardo:
1) O ex-presidente Raúl Alfonsín, "estrela" da revisão e chefe da União Cívica Radical, o principal partido de oposição ao governo de Menem.
Alfonsín desempenhou papel fundamental na reforma constitucional. No dia do juramento, Menem sussurou no seu ouvido: -"Parabéns, é uma obra sua";
2) Carlos "Cacho" Alvarez, da Frente Grande, o mais surpreendente fenômeno político do país, chamado por alguns, com exagero, de o "Lula argentino";
3) Aldo Rico, do Modin (Movimento Pela Dignidade e Independência), ex-líder dos carapintadas na rebelião armada da Semana Santa de 1987 contra o então governo Alfonsín.
O grande "frisson" do final dos trabalhos do Congresso revisor foi quando Aldo Rico e Alfonsín trocaram um aperto de mão.
Também participou da cerimônia de juramento da nova Constituição, a ex-presidenta e viúva de Juan Domingos Perón, Isabel Martinez, a Isabelita.
Segundo o diário "El Clarín", o único comentário que ela só quebrou o silência para comentar o papel do "chefe de gabinete", instituido pela nova Carta do país:
"O general Perón me dizia que se deveria dar mais trabalho aos ministros para que eles não destruam a figura do presidente", teria dito Isabelita.
Houve uma certa perplexidade na imprensa com o clima de cooperação entre as lideranças partidárias que participaram da reforma, ainda que ela suscite críticas.
Depois do chamado Pacto de Olivos, Menen tenta um "pacto social" com Alfonsín, para dar mais apoio ao plano do ministro da Economia Domingo Cavallo.
Menem convidou Alfonsin a participar do que chama de "economia social de mercado", da reforma do Estado e de um duro ataque ao déficit fiscal.
Mas um acordo social-econômico entre os dois é mais difícil por dois motivos:
1) O ponto mais criticado do programa econômico de Cavallo é o seu custo social (desemprego, alto custo de vida etc).
Alfonsín ataca o "neoconservadorismo" do programa econômico; Menem diz que ele é inegociável e que não aceitará uma "co-gestão" do plano;
2) As próximas eleições presidenciais. No dia do juramento da nova Constituição, o jornal "El Clarín" –o de maior prestígio no país– publicou uma pesquisa de intenções de voto para a sucessão.
Menem, que pertence ao Partido Justicialista (herdeiro das várias correntes do peronismo), fica à frente com 36%, mas longe de uma situação muito confortável.
Em segundo lugar está "Cacho" Alvarez com 24% e, em terceiro, o governador da província de Córdoba Eduardo Angeloz, do partido de Alfonsín, com 21%.
Pela nova Constituição, para ser eleito no primeiro turno, o candidato precisa:
A) Ter mais de 45% dos votos;
B) Ter pelo menos 40% dos votos e 10% ou mais de votos do que o segundo colocado.
Ainda faltando quase 10 meses para as eleições, o eleitor argentino já dá sinais das suas preferências. Este fato complica o "entendimento social" a curto prazo.
Criticado pela corrupção, pelo custo social do plano econômico e pelo atentado contra judeus, Menem parece exercitar com prazer explícito o jogo de xadrez político.
Ele estuda cuidadosamente a próxima jogada: lançar o ministro Cavallo como o candidato a vice-presidente na sua chapa.

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