São Paulo, domingo, 4 de setembro de 1994
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ENFRENTAR MUDANÇAS; FOCAR NO NEGÓCIO; CONCENTRAR A PRODUÇÃO; REVER PRIORIDADES; REDUZIR CUSTOS; ENXUGAR ESTRUTURA; APOIAR PARCERIAS

ENFRENTAR MUDANÇAS
Nos últimos quatro a cinco anos ocorreram três diferentes movimentos. O Brasil, que vivia em mercado fechado, regido por certas regras, mudou totalmente. O mercado se abriu, aumentando automaticamente a possibilidade de competição interna.
Ocorreu, paralelamente, uma crise bastante importante de tipo industrial-econômico. Houve necessidade de grandes mudanças culturais e de mentalidade.
A partir do início da década de 90, a crise mundial ampliou a disputa externa e a necessidade de globalização.
O pessoal da Pirelli no Brasil estava acostumado ao mercado fechado e às regras do jogo dele decorrentes. Os resultados em 1990, 1991 e 1992 foram de prejuízos econômicos fortes, sobretudo na área de pneus.
A área de cabos ainda apresentava lucros. Devido aos problemas financeiros, houve aumento do endividamento, o cash-flow tornou-se negativo.
O que fizemos diante disso? Tratamos de adotar mudanças rápidas. Mudando umas poucas cabeças pode-se construir novas mensagens e políticas. Qual foi a estratégia? Nada de heróico. Aproveitamos todos os investimentos que já haviam sido feitos.
Importante é que as fábricas dispensavam grandes investimentos fixos. Era necessário investir mais na organização do que na compra de máquinas novas, mais no software do que no hardware.
Além disso, olhar para os custos, não somente industriais, mas de transporte, logístico, de apresentação dos produtos.
Cada pedaço desses não é em si importante, mas a soma constitui um percentual que influi sobre o custo total.
Houve redução significativa no número de pessoas, de 11 mil para 7.500 atuais. E zelamos pela qualidade, não somente no que se refere aos certificados internacionais de qualidade, como também à cadeia de processos produtivos.
FOCAR NO NEGÓCIO
Quando começou a crise mundial, a maioria das empresas passou a distinguir as áreas mais estratégicas das que poderiam ser vendidas. A Pirelli se desfez da área de produtos diversificados, como mangueiras, correias e tubos.
O faturamento da Getoflex alcançava US$ 80 milhões anuais. Era uma empresa de lucros saudáveis, mas foi vendida porque tínhamos de concentrar o foco em duas áreas: cabos e pneumáticos.
Recursos de US$ 25 milhões resultantes do negócio ficaram no país e foram aplicados no aumento do capital da Pirelli Pneus.
Estamos agora vendendo ativos imobiliários, assim como nos desfizemos do banco Fintec e de uma agência de turismo. Limpamos tudo o que pudesse gerar dispersão e passamos a terceirizar o máximo possível.
No curso de dois anos, a partir de 1992, revertemos a situação: US$ 45 milhões a US$ 50 milhões negativos foram transformados em supéravit de US$ 40 milhões.
A produtividade por funcionário cresceu, assim como aumentou um pouco o volume de produção, graças sobretudo às exportações.Algo importante a considerar é que entre 1992 e 1994 os preços de praticamente todos os bens industriais declinaram entre 30% e 40%.
Enfrentamos essa realidade com uma estratégia de redução de custos obtida por meio da reestruturação da companhia.
CONCENTRAR A PRODUÇÃO
Medimos a produtividade em quilos por homem/hora. É um indicador relativamente preciso. O crescimento da produtividade foi da ordem de 10% em 1993 e alcançou 22% no primeiro semestre de 1994.
Em 1991, a Pirelli Cabos tinha mais quatro fábricas além das que existem hoje. Os equipamentos foram transferidos para as unidades de Santo André, Sorocaba e Cerquilho, no interior paulista.
A razão da transferência foi a concentração física das unidades de produção. Aprendemos a trabalhar com menores áreas e volumes de matéria-prima. Na verdade, sobrava espaço.
Essa concentração nos permitiu identificar talentos e realocar a competência onde era mais produtiva.
Houve uma melhoria na qualidade média do pessoal. Em meados de 1992, verificamos que isso não bastava.
Decidimos redesenhar a companhia. A especialização em unidades de negócios foi transformada em funções, com três áreas comerciais: mercado geral e industrial; telecomunicações e energia e exportações.
As fábricas foram reunidas sob uma única direção industrial. Ganhou-se com isso uma diferença de custo capaz de poupar US$ 4,5 milhões entre 1993 e o primeiro semestre de 1994.
Mais importante que isso é que conquistamos eficiência. Tivemos de rever todos os processos, o que tornou os defeitos visíveis. 71% das posições gerenciais foram trocadas.
Havia, em 1991, sete níveis hierárquicos. Hoje são cinco e, dentro de cada fábrica, existem no máximo dois níveis de comando. Isso resolveu o problema de velocidade e da qualidade na comunicação.
REVER PRIORIDADES
Mudamos os conceitos, aprimoramos os controles e há quatro anos temos desenvolvido um trabalho de preparação do pessoal para a qualidade total que começa a dar bons frutos.
Não se pode afirmar que a qualidade total seja uma panacéia, mas ajuda e bastante. Muda a cabeça das pessoas, faz com que todos trabalhem em time.
Fundamentalmente, restabelecemos o domínio real do processo produtivo e da administração da empresa.
A abertura do mercado trouxe uma revisão acerca da necessidade de se produzir determinadas linhas de produto. Antes, qualquer coisa que se pedisse era produzida no Brasil, porque era praticamente impossível importar.
Passamos a importar alguns produtos.
Tome como exemplo os fios finos para enrolamento de bobinas especiais. Atualmente é mais barato importar de Taiwan a bobina completa. Hoje Taiwan também coloca no Brasil fios extensivos de telefone por um preço levemente superior ao da matéria-prima. São dois exemplos apenas, entre muitos.
A Pirelli fez também algumas opções. Deixou de produzir chicotes para a indústria automobilística, porém intensificou a produção de cabos.
Hoje temos uma boa participação em cabos, apesar de termos saído da fase final, que era a a manufatura do chicote, que demanda mão de obra intensiva e uma especialidade que não era a nossa.
Racionalizamos linhas de produção procurando oferecer à clientela algum produto que substituísse dois ou três diferentes. Os próprios clientes estão racionalizando porque é mais barato encontrar fornecedores com produtos universais.
Outra atividade que implementamos foi a instalação na área de telefonia. Hoje não vendemos somente cabos telefônicos, sejam óticos ou metálicos, mas sistemas. Estamos instalando 22 mil linhas telefônicas em Joinville (SC) e participamos da ligação em fibra ótica realizada no circuito São Paulo-Rio de Janeiro.
REDUZIR CUSTOS
Muitos produtos destinados a estoques e à indústria automobilística já saem das máquinas com a embalagem que segue para o cliente. Isso não ocorria antes. Havia uma fase de embalagem especial separada da produção. Custava caro, devido à mão-de-obra intensiva empregada e não acrescentava valor ao produto. Atualmente, as próprias máquinas que produzem cabos são dotadas de equipamentos que possibilitam embalar o produto.
Outro exemplo: o fio de construção tem doze cores diferentes. Cada mudança de cor pressupõe mudança de máquina e parada para limpeza. Hoje essa troca é feita com o material em movimento e perda de apenas poucos metros de fios. O tempo de parada das máquinas para a troca foi reduzido de 50% para a faixa de 10% a 15%.
O prazo de entrega de materiais sob encomenda também encurtou. Temos fábricas flexíveis, menos graças às máquinas do que à gestão do sistema. Ninguém quer estoques. Compra para receber em 20 dias.
Em grandes séries de produção, o índice de desperdício é percentualmente pequeno, mas os volumes são significativos. Com o uso de sistemas automatizados e melhores medidores é possível controlar o desperdício.
Há dois anos, o índice médio de sucata era de 7% a 8%. Atualmente a média atinge 4,5%.
Antes, o controle do material era feito ao final do processo. Adotamos controles que impedem que o produto semi-pronto siga até o final da linha se não for perfeito.
ENXUGAR ESTRUTURA
Em 1992, a Pirelli Pneus acumulava perdas e no primeiro semestre de 1994 já apontava lucro de US$ 13 milhões. Como conseguimos isso? Conduzindo um programa em três etapas.
Na primeira etapa, que compreende 1991 e 92, foi necessário adaptar nossos recursos à situação do mercado, que tinha registrado perda de volume da ordem de 25% a 30%. Conduzimos nesse período um processo de "downsizing", que resultou na redução do quadro de 6.600 para 5.100 funcionários. Foi a etapa menos simpática.
A segunda etapa consistiu na otimização de recursos. Lançamos, no início de 1993, um programa de qualidade total, que passou a envolver a totalidade dos funcionários. O principal valor do programa foi ter facilitado a obtenção de todo o potencial humano disponível. Através desse programa, começamos a melhorar sensivelmente nossa situação.
Tanto é assim que, em janeiro de 1992, tínhamos um endividamento de US$ 60 milhões e hoje temos disponíveis US$ 30 milhões para investir no mercado. De forma concreta esse programa deu resultados eloquentes.
O programa ocupou-se da logística, que envolve armazéns e distribuição. Isso requereu detalhado planejamento para obtermos avanços.
O prazo médio de entrega de mercadoria para os clientes lojistas, de quase dez dias, foi reduzido para seis dias e meio.
Hoje entregamos a encomenda em apenas 48 horas para clientes posicionados em um raio de 200 quilômetros da fábrica.
O diagnóstico de definição de problemas pode demorar de dois a seis meses, mas a solução é imediata. Um programa de redução de custos conduzido em 1993 resultou em economia de US$ 10,7 milhões. Contabilizou-se menor volume de refugos e economia de energia elétrica, além de melhor aproveitamento do maquinário.
APOIAR PARCERIAS
Na área comercial e de marketing desenvolvemos, em parceria com os clientes, o mesmo tipo de tecnologia. Procuramos levantar o que o usuário de pneus espera do produto e do atendimento nas lojas.
Nossa rede de revendedores é formada por 450 lojas em relação às quais, mais do que exclusividade, temos uma forte presença. Determinamos um plano de ação para identificação das lojas com a marca e de melhoria dos serviços que possibilitaram melhorar a rentabilidade desses clientes.
Não se trata aí somente de agregar valor econômico, mas consistiu em importante reforço de nossa imagem corporativa. A Pirelli detém aproximadamente 34% das vendas no mercado nacional de pneus.

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