São Paulo, sábado, 10 de setembro de 1994
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Um voto desconfiado

Clóvis Rossi
SÃO PAULO – O economista Eduardo Giannetti terminou sua coluna de domingo passado nesta Folha com uma previsão ao mesmo tempo sombria e realista sobre o futuro pós-eleitoral.
"Se os beneficiários eleitorais do Plano Real não forem capazes de honrar a promessa que os está elegendo (a da estabilidade), a decepção com o sistema democrático será profunda e a sobrevivência da nossa democracia poderá ficar seriamente ameaçada", escreveu Giannetti.
Foi antes do caso Ricupero, que já começa a gerar decepção, se não com a democracia, ao menos com os homens públicos, conforme mostrou Josias de Souza em sua coluna de ontem. Pesquisas qualitativas feitas pelo próprio PSDB apontam uma certa estabilidade na intenção de voto em Fernando Henrique, mas acompanhada de desconfiança.
Parece não ser exagero dizer-se que parte do eleitorado de FHC está praticando o voto "não tem tu, vai tu mesmo". É, de resto, o que acontecia antes com Lula.
Na América Latina, nunca se pode apostar cegamente na sobrevivência da democracia, por mais que a etapa dos golpes pareça fora de moda. Afinal, a descrença nos homens públicos faz muito mal ao sistema, além de debilitar o governo, qualquer que seja.
O brasileiro parece tão desconfiado que é incapaz de formar nas urnas uma maioria de fato absoluta em favor de quem quer que seja.
Collor nem no segundo turno fez tal maioria, se forem computadas a abstenção e os votos nulos e brancos. FHC, no momento atual, teria entre 4 e 4,5 de cada 10 eleitores. Visto pelo avesso, teria entre 55% e 60% de indiferença ou hostilidade no conjunto do eleitorado.
O pior é que o episódio Ricupero forçou-o a radicalizar na afirmação de que o real é uma obra pronta e acabada. Não é. Para voltar a Giannetti: "O Plano Real tem condições de nos levar até a posse do próximo presidente, mas não mais do que isso".
O diabo é que nem o mundo nem o Brasil acabam no dia 3 de outubro, 15 de novembro ou 1º de janeiro.

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