São Paulo, domingo, 18 de setembro de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Feldmann diz que é preciso mudar o funcionamento do Legislativo

CLÓVIS ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

O deputado federal Fábio Feldmann (PSDB), especialista em meio-ambiente, tenta a reeleição para a Câmara dos Deputados com a intenção de reformar o Legislativo. Esse projeto é quase uma obsessão para o peesedebista, que acha que, com a arquitetura atual, o Congresso "não tem remédio".
Folha - Qual o primeiro projeto que o senhor pretende apresentar à Câmara Federal?
Fábio Feldmann - Seria um projeto de reformulação do Legislativo. É preciso reformular o Parlamento para que ele possa atender a sociedade. Estou convencido de que, com a atual arquitetura, o Parlamento nunca vai funcionar.
Folha - Concretamente, como é que o senhor montaria essa nova arquitetura?
Feldmann - Fortaleceria as comissões temáticas, para transformar o plenário apenas em instância de recurso. O coração do Parlamento, em especial da Câmara, deve ser as comissões temáticas. Como está estruturado, o Parlamento não pode funcionar melhor.
Entre minhas propostas, está criar uma Comissão de Futuro no Parlamento. Uma idéia é, por exemplo, pegar uma data de referência, tipo 2.025 ou 2.050, e tentar trabalhar as estratégias e os cenários para essa data. É uma tentativa de fazer o Parlamento trabalhar a longo prazo.
Folha - Mas o senhor não acha que, além da mudança na arquitetura do Parlamento, é preciso fazer alterações no sistema partidário e eleitoral?
Feldmann - Sem dúvida. São necessárias mudanças como a introdução do voto distrital misto, mudar a questão da fidelidade partidária e vários outros pontos.
Folha - Isso pode ser feito sem Assembléia Revisora exclusiva?
Feldmann - Eu tenho dúvidas quanto à possibilidade de ocorrer uma Assembléia Revisora exclusiva. Mas, se fosse possível, eu mesmo seria candidato para o Parlamento exclusivo e não para o Parlamento normal.
Folha - O senhor dá a sensação de que está meio decepcionado com o meio-ambiente em que trabalha, o Legislativo.
Feldmann - Por isso há a necessidade de reformas. O Parlamento tem vários problemas, como o da qualidade da representação. Acho que há um campo de ação que é uma questão de transferência de poder interno.
A Mesa continua tendo um poder excessivo, em detrimento das comissões temáticas. Eu fui presidente da Comissão de Meio-Ambiente, Consumidor e Minorias. O trabalho nas comissões é absolutamente desvalorizado na Casa, ao contrário do que ocorre em qualquer outro Parlamento do mundo. A própria imprensa não valoriza.
Para se ter uma idéia, basta dizer que deputado não tem computador. Nós não temos nem fax. Eu não estou fazendo uma reclamação corporativa. Estou dizendo que é lamentável que não estejamos integrados (pelo computador) ao Prodasen (o serviço de processamento de dados do Senado) e não sintamos falta disso.
É importante acrescentar que não estou só nessa proposta de reformulação do Legislativo. Há vários outros candidatos à reeleição com o mesmo espírito. A idéia é a de, assim que acabar a eleição, começar um trabalho de "capturar" os novos deputados para que eles não se deixem levar pelo esquema fisiológico que existe na Câmara.
Folha - O senhor não teme que essa idéia colida com os interesses do novo governo, supostamente de Fernando Henrique, que vai querer um Legislativo mais dócil e mais rápido na aprovação de suas medidas?
Feldmann - Acho que não. O Fernando Henrique conhece o Parlamento. Acredito que ele tem um compromisso com um Parlamento mais digno perante a sociedade.
Por isso estou propondo a Comissão de Futuro. Tem que haver uma comissão que defina a agenda. Eu estou trabalhando faz uns dois anos em um projeto de águas que talvez seja o mais importante do Brasil, mas não consigo sensibilizar o Parlamento, que só se move por questões conjunturais.
Mesmo as CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito) revelam um problema sério. O parlamentar vai para a CPI porque ele se promove e porque o deputado que não está na CPI dá a impressão de que não faz nada.
Folha - Seria culpa dessa arquitetura o fato de a imagem dos políticos ter chegado hoje ao seu ponto mais baixo?
Feldmann - O que aconteceu é que a Constituição transferiu poderes, mas esses poderes continuam na mão das lideranças políticas antigas, em aliança com a burocracia da Câmara. A imagem dos políticos é muito ruim, mas temo que se caia em teses que levem à valorização indireta do regime autoritário. É preciso encontrar soluções institucionais.
Folha - Em termos partidários, o senhor acha que essa enorme frente que está se formando em torno de Fernando Henrique e que tende a crescer...
Feldmann - Eu vejo duas hipóteses. Uma é começar a se pensar, o que acho que está mais difícil, em um novo partido de centro-esquerda. Uma reformulação partidária seria interessante, abrangendo, por exemplo, o Jaime Lerner, do Paraná, muita gente do chamado PMDB ético e do PT.
Na minha opinião, o Fernando Henrique vai ter que fazer um grande esforço para neutralizar a direita fisiológica e de certa maneira a esquerda corporativa.

Texto Anterior: Genoino propõe reformas que dêem eficiência ao sistema democrático
Próximo Texto: Brizola terá que dividir poder no PDT
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.