São Paulo, domingo, 18 de setembro de 1994
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Viabilidade da Revisão Constitucional

OTTO CYRILLO LEHMANN

"Sou conservador para salvar tudo o que há de bom na Constituição; sou radical para suprimir ou alterar tudo o que ela tenha de mau". (Disraeli)

O atual Congresso Nacional ainda tem a oportunidade de saldar uma dívida antiga com os brasileiros, representada pela obrigação, não cumprida, de executar a revisão constitucional. Ninguém melhor que os senadores e deputados têm consciência da necessidade imperiosa desta revisão, sob pena de tornar o Brasil ingovernável e de deixar pendentes por muito tempo questões sérias como a distribuição de renda, saúde, reforma da previdência e voto distrital, entre outras.
Os constituintes de 1988, à época, não conseguiram harmonia entre seus pares para a elaboração de diversos diplomas constitucionais, explicitaram no art. 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a necessidade de uma revisão futura e até marcaram prazo para isto. Um prazo de cinco anos, já ultrapassado. Esclareceram, para maior entendimento posterior, que a revisão deveria ocorrer "pelo voto da maioria absoluta dos membros do congresso, em sessão unicameral".
A revisão tornou-se um desejo de cidadania dos brasileiros que reclama urgência. Para efetivá-lo, bastaria aos atuais congressistas promover mudanças no art. 60, da Constituição, mesmo mantendo os critérios definidos no parágrafo 2º, mas estabelecendo a aprovação das emendas pelo voto da maioria absoluta. É este aliás um princípio que se inspira no art. 3º, das disposições transitórias. Vale lembrar que as sessões deverão ser unicamerais.
Se o atual Congresso der apenas este passo, já estará aberto o caminho pelo qual os futuros congressistas poderão trafegar para o resgate da dívida dos seus antecessores.
Nem se insista mais que as constituições não devam ser emendadas, porque não é isso que ensina a boa doutrina. Depois de asseverar que "as constituições valem bem pouco", em especial quando tolhem anseios sociais, enfatizou o mestre Pontes de Miranda, em seus comentários à Constituição de 46: "Constituição que se impõe ao tempo e este não lhe consegue corroer os textos, ou alterá-los em discussão normal, é constituição que só deixa ao povo, ou às gerações que nela não vêem solução para seus destinos, o recurso da revolução".
O clássico Barbalho, ao comentar o art. 90, da Constituição de 1891, já advertia como perigoso vedar ou cercear através de obstáculos legais insuperáveis as reformas constitucionais. Observava, com sabedoria, que quando o povo de fato quer a reforma, nada lhe poderá obstar. E, concluía o tratadista: "É sempre melhor que elas (as reformas) se façam pelos trâmites estabelecidos em lei, do que se realizem por processos violentos e revolucionários".
Este tema da revisão constitucional, por paradoxal que pareça, tornou-se momentoso e bem atual no bojo desta campanha eleitoral destinada à recomposição democrática dos quadros diretivos do país.
O entusiasmo e o vigor das discussões farão com que o vencedor assuma a Presidência da República com a força de uma verdadeira escolha plebiscitária, com características de uma revolução branca, carregada de esperanças no futuro.
Os congressistas, portanto, tanto os que concluem seus mandatos, quanto aqueles que se vão iniciar, não podem ficar surdos a esse anseio da cidadania brasileira, diante da responsabilidade que lhes é intrínseca como intérpretes dos sentimentos e das aspirações nacionais.
Ninguém ignora as nítidas concepções dos deveres dos homens públicos da atualidade e, em especial, os políticos devem, com sua sensibilidade, entender a força de uma opinião pública em marcha, até para que se tornem coordenadores desse movimento.

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