São Paulo, domingo, 18 de setembro de 1994
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Um desafio arquitetônico

Construir o Globe é um ato de fé, diz projetista

SÉRGIO MALBERGIER
DE LONDRES

O projeto atual do Globe e dos demais prédios do complexo está a cargo dos arquitetos Jon Greenfield e Theo Crosby, da firma de arquitetura londrina Pentagram Design.
O principal trabalho deles foi reunir as informações coletadas por acadêmicos e arqueólogos para tornar prática a reconstrução do teatro, conta Greenfield à Folha. Ele diz que o projeto "desafia todas as noções" sobre contruir prédios hoje em dia, e acha que o trabalho é um "ato de fé" cujo resultado final só poderá ser bem avaliado após a construção.
As principais diferenças do novo Globe em relação ao original foram introduzidas por causa das medidas de segurança atuais. As saídas e o espaço entre as fileiras de assentos foram aumentadas e as escadarias que levam aos balcões passaram de uma para três.
Outra mudança determinada pelas regras de combate a incêndios é a introdução de substâncias para retardar a ação do fogo tanto nas toras de carvalho da estrutura do teatro como nas paredes de madeira e argamassa e no teto de palha.
Cerca de 20 pessoas trabalham atualmente na obra. Além de pedreiros e carpinteiros da firma McCurdy & Co., especializada em recriar e restaurar prédios antigos, trabalham no local estudantes e especialistas em arqueologia e restauração.
*
Folha – Como foi o trabalho do sr. e de Theo Crosby?
Jon Greenfield –Foi um trabalho coletivo. O projeto existe há 25 anos. Sam Wanamaker reuniu uma equipe de acadêmicos liderada pelo professor Andrew Gurr e várias pessoas de diferentes campos que pudessem contribuir foram contadas. Depois disso houve as descobertas arqueológicas e arqueologistas aderiram à equipe.
Folha –Qual foi o trabalho específico dos arquitetos?
Greenfield –Fomos na verdade o ponto final e concentrador das informações dos outros. Recebemos informações dos outros. Recebemos informações e direções às vezes conflitantes ou pouco práticas. Nosso trabalho foi receber estas informações e a partir delas projetar uma forma de construir o Globe.
Folha –Foi um grande desafio, difícil de realizar?
Greenfield –Sem dúvida. A única coisa que facilitou o nosso trabalho foi a existência de um consenso sobre como o Globe deveria ser, um consenso acadêmico. Mas isso só ocorreu após recentes pesquisas que convenceram a todos sobre alguns aspectos do Globe.
Folha –Qual o aspecto mais difícil da reconstrução?
Greenfield –A obtenção de fundos, com certeza.
Folha –Em termos arquitetônicos, digo.
Greenfield –A parte mais difícil será a construção das colunas que sustentarão o dossel que vai cobrir o palco, o que ainda não começamos. O trabalho até aqui foi muito fácil, do ponto de vista prático. E muito estimulante. Desafia todas as noções que se tem sobre construir prédios hoje em dia porque é muito fora do comum. O Globe é um prédio tão impressionante que fica na memória de quem o visualiza.
Folha –Não havia arquiteto na época do Globe.
Greenfield –Não. Procurava-se um empreiteiro para construir. Devia haver apenas dois ou três arquitetos na época de Shakespeare na Inglaterra e só os procurava quem era muito, muito rico.
Folha –Estão sendo usadas técnicas modernas na reconstrução?
Greenfield –Usamos ferramentas atuais, tratores e guindastes. Mas a forma de usar a madeira, o formato das juntas e articulações e como elas se encaixam são totalmente originais da época, além dos materiais de construção.
Folha –O sr. às vezes sente que seria mais fácil usar concreto ou ferro em algumas partes do projeto?
Greenfield –(ri) Se fôssemos trabalhar desta forma em todos os prédios, sim. É um projeto muito complexo e os outros prédios serão construídos com técnicas e materiais modernos.
Folha –É possível prever como será a acústica do Globe ou como será sua forma final?
Greenfield –Não. Tudo isso é na verdade um ato de fé, que, nós esperamos, terá um final feliz. Estamos tentando construí-lo da forma mais autêntica possível. É como tentar tocar música barroca em instrumentos da época. Às vezes o resultado pode ser péssimo.
Folha –Quão fiel será este Globe ao original?
Greenfield –Nós não sabemos, para falar a verdade. Tudo que estamos fazendo é baseado em suposições, feitas através de pesquisas mais rigorosas possíveis. As três únicas grandes mudanças que fizemos no prédio estão ligadas a regulamentos de segurança: a colocação de mais duas escadarias (havia apenas uma no original), o aumento do tamanho das portas das saídas e o aumento do espaço entre as fileiras de assentos. Fora isso, eu diria que o Globe é bem autêntico.

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