São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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É hora de decidir pela soberania

HÉSIO CORDEIRO

Deu na Folha: "Comeu feijoada e declarou que a campanha acabara". Fernando Henrique exercita, agora, as alternativas para compor o ministério e até cogita convidar o PT para escalões intermediários.
Lula persegue uma carreata em Volta Redonda, buscando por onde anda a aguerrida militância. Talvez procurando na greve do ABCD a renovação das esperanças no segundo turno. E nós, do PDT, com Brizola, continuamos desafiando os impérios da comunicação. Na reta de chegada, vale a pena rever os programas para assegurar coerência na decisão.
Os três programas propõem mudanças para a consolidação da democracia. Diferem no significado destas mudanças.
O PT proclama seus caminhos inspirado na mobilização e na participação das camadas já organizadas: sindicatos, urbanos e rurais, organizações comunitárias, intelectuais, profissionais e até pequenos empresários.
A mobilização permanente, na utopia petista, irá superar "a hegemonia conservadora" e implementar uma política "antilatifundiária, antimonopolista, antiimperialista e democrático-popular".
O PDT reafirma o projeto histórico do trabalhismo como o caminho para uma sociedade mais justa, menos corporativa. É a construção da nação ainda inconclusa, limitada em sua soberania por relações internacionais desfavoráveis e desequilibradas que favorecem as grandes potências e as elites ainda insensíveis, às demandas do povo.
A mudança, aqui, é o projeto político prioritário dirigido às massas que não se representam organicamente, ao povo cada vez mais excluído pelos modos de desenvolvimento dos últimos 30 anos.
FHC propõe a passagem de um modelo de industrialização protegida a um "modelo economicamente sustentado", aberto em suas relações internacionais e competitivo. Os fundamentos para estas transformações estão na estabilidade econômica, na continuidade, sem sobressaltos, das regras do jogo econômico.
É como se a parceria solucionasse as relações assimétricas entre o Brasil e os novos blocos de poder. Para tanto, uma das políticas estratégicas é a das privatizações, inclusive dos setores que a atual Constituição estabeleceu como monopólio da União.
Trata-se de acelerar as privatizações em nome da competitividade internacional. O gigantismo do Estado, ineficiente e clientelista parece estar com seus dias contados, com a eleição de qualquer um dos três candidatos.
Contudo, PDT e PT dão ênfase às denúncias das distorções das privatizações e, ambos, querem revê-las em função das suspeitas de irregularidades. Coincidem na manutenção dos dispositivos constitucionais referentes ao monopólio do petróleo e das telecomunicações pela União.
Destaca o PDT que "à medida em que se abandone a dimensão patrimonialista e fiscalista do programa de privatização, será possível direcioná-lo para uma rearticulação (...) entre público e privado e entre setores estratégicos e não estratégicos".
Esta proposta deixa clara a posição do PDT, que defende um Estado forte, ágil e com capacidade de decisão e de direção das políticas públicas.
A leitura dos silêncios e omissões também é relevante. No programa de FHC não se menciona o conceito constitucional de seguridade social e seu papel no financiamento da saúde.
A Previdência, um dos componentes da seguridade, é tratada no âmbito da reforma do Estado, logo em seguida à reforma fiscal, com predomínio, portanto, de seu papel no programa de ajuste econômico. Isto é um retrocesso que compromete as funções redistributivas da seguridade social. Volta a ser considerada muito mais como variável econômica do que social.
Em relação à educação, aí reside a diferença mais fundamental. Embora concordem todos que a evasão ou repetência no ensino básico seja o problema mais importante, nem PT nem FHC assumem a escola de tempo integral, sobretudo nas periferias das áreas metropolitanas e nas favelas.
Para nós, do PDT, esta é a reforma de base estratégica para a criação de sólidos alicerces da nova sociedade. A escola de horário completo será implementada em conjunto com a progressão contínua para garantir que não haja interrupção do processo de aprendizagem.
Os dois outros candidatos não vão além das reformas curriculares cosméticas, da proposição de melhorar a qualidade do material didático ou da óbvia necessidade de formar e valorizar os professores.
Vamos estar optando por decidir nossos próprios rumos com soberania, desenvolvimento e justiça social, segundo propõe o PDT; ou por uma pretensa modernidade integrada à economia internacional com reduzida capacidade de intervenção estratégica do Estado conforme preconiza a proposta de FHC; ou por uma sociedade com hegemonia dos interesses de trabalhadores de setores de ponta já internacionalizados que resultará do projeto do PT.

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