São Paulo, domingo, 25 de setembro de 1994
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Redução da inflação força mudança

PAULO CÉSAR XIMENES

O sistema financeiro passará por profundas transformações ao longo dos próximos quatro anos, motivadas pelas mudanças que já começaram a ocorrer na economia brasileira, que vieram preceder as ações a serem adotadas pelo próximo presidente da República.
De fato, com a implantação do plano de estabilização, foram lançadas as bases que determinarão essas mudanças. A redução da taxa de inflação a níveis civilizados forçará o enxugamento do sistema financeiro: fusões, incorporações e redução no número de agências serão consequências inevitáveis. É chegada a hora da verdade para os bancos oficiais, federais e estaduais, cujo ajustamento não poderá mais ser postergado.
Por outro lado, com a redução da dívida mobiliária em circulação e o equilíbrio fiscal, a economia recuperará condições para crescimento em bases sustentadas e o sistema financeiro retomará o seu papel de financiar a produção e o consumo.
Haverá uma rearrumação gradativa e sem traumas do sistema como um todo, com um repensar sobre vocações, nichos de mercado, e com aumento da participação do capital externo, caso eliminada a vedação imposta pela Constituição.
Talvez por entender que as transformações que ocorrerão no sistema financeiro virão a reboque das mudanças que já se observam na nossa economia, a proposta de governo de Fernando Henrique Cardoso não se refere especificamente ao sistema financeiro. Apenas nas "Diretrizes para uma Economia Competitiva", é previsto o fomento do mercado de longo prazo, "com participação efetiva do setor financeiro privado, cabendo ao BNDES o papel de agente complementar e de suporte ao sistema".
Já no programa de governo do Partido dos Trabalhadores ("Uma Revolução Democrática no Brasil"), o sistema financeiro é tratado em um nível de detalhe muito maior e propõe, basicamente, "dotar a sociedade de mecanismos de fiscalização e controle sobre a atividade do sistema público e privado e criar mecanismos para garantir que estas instituições assumam sua parte no esforço do desenvolvimento econômico e social do país...".
É lamentável que o PT não reconheça o trabalho de fiscalização do Banco Central, que dá prioridade à avaliação das condições patrimoniais das instituições integrantes do sistema financeiro, como forma de proteger a poupança popular.
São válidas muitas das preocupações levantadas no programa do PT sobre as distorções existentes no sistema financeiro e no mercado de crédito (ciranda financeira, taxas de juros elevadas, prazos curtos etc) e a necessidade de direcioná-los para o financiamento dos setores produtivos. A correção dessas distorções tornou-se factível, a partir da estabilidade econômica alcançada pelo Plano Real.
O programa do PT é também contraditório. Propõe a reabertura das negociações com os credores externos, ameaçando-os com a suspensão do pagamento da dívida em caso de intransigência da parte deles e, ao mesmo tempo, prioriza o "desenvolvimento de novos mecanismos de captação de recursos externos que possibilitem o alongamento do prazo de permanência desses capitais no Brasil, a fim de que estes possam vir a financiar o incremento dos investimentos produtivos".
Finalmente, a questão da independência do Banco Central na formulação e execução da política monetária, que poderá ser incluída no conjunto de reformas que seriam propostas ao início do próximo governo, visando dar ao Poder Executivo condições de governabilidade.
O PT tem se manifestado contrário a essa autonomia e, lamentavelmente, o programa tucano é omisso nesse aspecto. Entretanto, como na implantação do Plano Real a equipe econômica pretendeu incluir tal dispositivo como um dos elementos básicos do plano, para conter as inevitáveis pressões por aumento dos gastos públicos, é de se esperar que o assunto volte a ser discutido brevemente.

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