São Paulo, terça-feira, 27 de setembro de 1994
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Sobre o trampolim sindical e o fantasma de Getúlio

LUÍS FRANCISCO CARVALHO Fº

LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A bancada sindicalista vai crescer. É o que o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) anuncia como um dos possíveis resultados da supereleição.
Não há nada a comemorar. O que parece ser "progressista" ou "politicamente correto" não passa de mais uma deformação eleitoral, como o próprio coronelismo. O desinteresse pelo Poder Legislativo é tão grande; a estrutura partidária é tão frágil e contaminada que os candidatos à Câmara dos Deputados e às Assembléias Legislativas com mais chance de vitória são, além dos caciques de sempre e dos personagens do rádio e da TV, os representantes das categorias profissionais melhor organizadas.
O sindicalismo virou trampolim para a vida política, como muitos clubes de futebol do interior. Não falta dinheiro (imposto sindical) nem espaço na mídia (cada greve e cada negociação projetam novas "lideranças"). O "curral" está pronto, mobilizado.
Ser deputado é um degrau da carreira de quem vive em entidades de classe, como sindicatos, associações etc. Como o horário gratuito não serve para informar, pelo menos nas eleições proporcionais, o eleitor acaba optando por um coleguinha de profissão, pensando na melhoria da sua qualidade de vida.
O PT é a legenda de maior penetração nesse meio, por motivos óbvios, mas os sindicalistas, "pelegos" ou "autênticos", "patrões" ou "empregados", espalham-se pelos diversos partidos. Aliás, possivelmente em virtude dessa deformação, o programa do PT no horário eleitoral é cada vez menos requintado do ponto de vista político e ideológico, cada vez mais parecido com o do PTB, na forma e no conteúdo.
A receita é mistificar. Partido que se preza tem pelo menos um bancário candidato. Metalúrgico deve votar em metalúrgico, ferroviário em ferroviário, petroleiro em petroleiro, comerciante em comerciante, advogado em advogado, servidor em servidor. Para se resolver o drama da saúde é preciso votar em médico, em enfermeiro. A crise da educação depende da eleição de professores...
Só que a maioria dos eleitos se esquece que o país é muito maior que a "categoria". Como é preciso se reeleger, o parlamentar-sindicalista continua cortejando seus eleitores com todo tipo de favorecimento. O corporativismo corre solto e o fantasma de Getúlio ri à toa.
Romeu Tuma
É irresistível um pequeno comentário sobre a entrevista do candidato do PL ao Senado, publicada domingo. Tuma, policial com 40 anos de carreira, diz que não sabe se é a favor ou contra a pena de morte. Fala que não teve conhecimento que subordinados seus iriam patrocinar a invasão truculenta da Folha, o maior jornal do país e o único que, naquele momento, empenhava-se numa cobertura crítica do governo Collor.
As pesquisas indicam que Tuma vai repetir, com particularidades, a trajetória de Filinto Müller, chefe de polícia da ditadura de Getúlio Vargas e, anos depois, democraticamente eleito senador da República. Tão hábil, que, no seu caso, o passado também desaparece (assim como os desaparecidos simplesmente desapareceram) e não interfere na política.
No lugar de Filinto Müller, Tuma responderia a um entrevistador imaginário: eu não sabia que Olga (a mulher de Prestes, entregue a Hitler) era judia... Tão hábil, que as pessoas iriam acreditar.

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