São Paulo, quinta-feira, 29 de setembro de 1994
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Choque X gradualismo

O anúncio do IPC-r de setembro de 1,5%, inferior, portanto, ao de agosto, não impede uma virtual unanimidade de previsões de inflação ascendente para outubro, podendo passar de 2%. Permanece o alívio, com três meses de real, mas é evidente que ainda será preciso muito rigor e iniciativa.
Importa salientar que o aumento no preço de alguns produtos agrícolas é temporário. Expressa circunstâncias como a entressafra e a seca. Seria portanto razoável esperar que a inflação depois retomasse a trajetória declinante.
O problema é que ainda existe no sistema econômico um resquício de indexação, já que o próprio IPC-r corrigirá automaticamente os salários nos próximos meses. O que deveria ser uma pressão casual ou passageira pode acabar entrando na memória da economia, se repassada aos preços, ajudando a criar uma inflação resistente à baixa.
O maior desafio até o final do ano é portanto, além de garantir o equilíbrio fiscal, conviver com essa regra de indexação. Há duas trajetórias alternativas de política econômica. De um lado, é possível lançar uma ofensiva contra o repasse e os germes de reindexação, forçando uma queda de preços que compense o aumento de salários e os fatores sazonais de pressão inflacionária. Os instrumentos para tanto seriam juros ainda mais altos, valorização do real e mais importações. Seria uma estratégia de choque.
A alternativa é aceitar o processo de recomposição salarial e apostar numa acomodação gradual. Nesse caso, medidas mais duras contra o consumo ou choques de oferta seriam postergados se a inflação ficasse relativamente estável.
A terapia de choque é sempre mais dolorida, mas supõe a expectativa (nem sempre confirmada) de que a cura seja mais rápida. O gradualismo é politicamente mais cômodo, mas traz o risco implícito de que a estabilidade momentânea seja apenas um frágil armistício na guerra contra a inflação. O dilema entre choque e gradualismo tem evidentes implicações políticas. Como a decisão se dará depois das eleições, o rumo da política econômica tenderá a ser mais econômico do que político. O futuro dirá.

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