São Paulo, quarta-feira, 4 de janeiro de 1995
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Bons ventos sopram por nossas bandas

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Quando o menino Ronaldo cruzou a faixa de chegada, na avenida Paulista, o Brasil fechava um ano de ouro. A conquista do tetra, as meninas do vôlei e do basquete, a escalada de alguns novos boxeadores no ranking mundial e, por fim, a São Silvestre, certamente a mais árdua tarefa para o nosso esporte. Sim, porque no futebol, no vôlei, no basquete, no boxe, já temos uma longa história de glórias. Mas, na São Silvestre, desde que ela virou uma corrida internacional, raros foram os brasileiros que venceram.
Alguns astrólogos dizem que o Brasil está entrando numa conjunção favorável, enquanto sociólogos (e eles entraram na moda novamente) asseguram que as vitórias no esporte são apenas sintomas de que este país começou a retomar a caminhada em direção ao seu verdadeiro destino, como gostavam de dizer os tribunos de antigamente. E vão além: basta lembrar da era Juscelino, um breve período de nossa história durante o qual se conseguiu combinar democracia plena com desenvolvimento. Pois foi exatamente quando surgiu Pelé, ganhamos o primeiro Mundial, Éder Jofre colocou o mundo a nocaute, Adhemar Ferreira da Silva flutuou sobre Helsinque e Maria Ester Bueno fez a rainha curvar-se a seus pés.
Ah, sim, vivemos a morte de Ayrton Senna. Mas até essa tragédia teve um lado luminoso, pois serviu para cimentar um pouco nossa solidariedade, atributo essencial a um povo que busca a cidadania, sem a qual não há povo ou país.
Algo no ar parece indicar que bons ventos voltam a soprar nestas bandas do hemisfério. Só resta acertar a hora de içar velas e tocar o barco, devagar, porém, como recomenda o velho marinheiro.

Por exemplo: outro dia, fiz uma reflexão sobre a presença de Pelé no recém-inventado Ministério Extraordinário dos Esportes. Logo depois, em longa entrevista, o próprio Pelé se incumbiu de revelar claramente que não tem nenhum plano, nenhum projeto específico para tocar a sua pasta. Pretende reunir o que há de melhor em todas as modalidades, ouvir sábios conselhos e, a partir daí, criar um projeto. Compare-se tal postura com a de outro ministro, na área das comunicações, Roberto Muylaert, que, antes mesmo de ser convidado, já tinha pronto um plano de ação para colocar as TVs educativas a serviço da cultura e educação.
Mas, até mesmo Pelé no ministério tem um lado positivo. Não só confere maior popularidade ao governo que acabou de ser empossado, como também cria uma barreira para as desmedidas ambições do grupo de cartolas que orbita em torno do presidente da Fifa, João Havelange. Acho que Pelé não tomaria iniciativa que os acuasse. Sua escolha, contudo, é uma sinalização do governo no sentido de que a vida não lhes será tão fácil.
Já é um avanço. Pois, se nosso futebol prescinde de interferências governamentais, por outro lado carece de uma gestão mais impessoal e competente. Se a presença de Pelé no governo servir para isto, já terá cumprido sua tarefa com louvor.

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