São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 1995
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Estupro presumido de menor requer provas da violência

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA FOLHA

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul absolveu um rapaz –condenado a seis anos de reclusão em primeira instância– da acusação de estupro presumido. Ele teve relações sexuais, de comum acordo, com sua namorada, então com 12 anos de idade, e foi denunciado à polícia pelo pai da menina.
O Código Penal diz que presume-se a violência do ato sexual, logo o estupro, quando a mulher é menor de 14 anos. Mas o tribunal concluiu que a presunção de violência, baseada na idade da vítima, é relativa e, no caso, não existiu.
Para o desembargador Celso Limongi, do Tribunal de Justiça de São Paulo, em casos como o que foi julgado em Mato Grosso do Sul, os juízes "às vezes têm que contornar o rigor da lei. Não se pode ficar longe da realidade. Conforme o porte físico e o comportamento da vítima, e se as provas não confirmarem a violência, o réu não deve ser condenado", afirma.
O advogado criminalista Alberto Toron concorda. Para ele, a presunção de violência prevista no Código Penal não é absoluta, portanto admite prova em contrário. "A presunção de violência deve ser abolida da legislação. Violência deve ser sempre provada", diz.
Na mesma linha, a promotora de Justiça Luíza Nagib Eluf afirma que a lei, do jeito que está, pode resultar em injustiça. "Presumir violência no ato sexual, sem provas, não faz sentido. Se a vítima diz que não houve violência, não se pode concluir que houve. É injusto", interpreta.
Para ela, a vítima deve sempre ser ouvida. "No caso Paiakan, a menina estuprada por ele não foi ouvida. Tudo o que ela disse não foi levado em conta pelo juiz. O mesmo aconteceu com os laudos periciais que concluíram ter havido violência", diz.
Ela lembra que a figura do estupro presumido surgiu porque considerava-se que a menor de 14 anos não tinha maturidade para decidir sobre sua vida sexual. O seu consentimento não era válido.
No caso julgado em Mato Grosso do Sul, o acusado confessou que manteve relações sexuais com a namorada, mas deixou claro que o ato foi consensual.
A menina confirmou as declarações do namorado. Disse que tinha pleno conhecimento "das coisas do sexo e suas consequências", que quis o ato sexual e o praticou livremente. Além disso, afirmou que continuava a namorar o acusado e queria casar com ele, mas que seu pai se opunha ao casamento.
O fato aconteceu durante uma madrugada, quando o casal passeava em companhia de outros jovens de festa em festa. As testemunhas que estavam presentes no local onde os dois se encontravam, afirmaram que nenhuma violência foi cometida, ratificando integralmente as palavras da menina.
O desembargador Rui Garcia Dias concluiu que a vítima, embora menor de 14 anos, foi quem procurou o réu e insistiu para manter relação sexual. "É uma menina que tem a aparência de adulta. Por questões formais, nós temos que fazer mais justiça do que legalidade", afirma.

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