São Paulo, domingo, 15 de janeiro de 1995
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A ignorância ajuda a universidade

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – O ministro da Educação, Paulo Renato Souza, revelou a esta coluna que vai se empenhar para acabar com um dos mais notáveis absurdos do país: a aposentadoria precoce dos professores universitários. Atualmente, um professor pode ir para casa antes mesmo de completar 50 anos – ou seja, no auge de sua capacidade intelectual.
"Não podemos tolerar que gente tão qualificada seja desperdiçada", disse o ministro. O pior é que se dissemina uma delinquência: o professor se aposenta e, depois, faz concurso para acumular dois rendimentos.
É uma delinquência estimulada pela lei: ao se aposentar, o professor passa a ganhar vantagens adicionais em seu rendimento. Isso já seria intolerável num país de Primeiro Mundo. Imagine-se, então, numa nação de pobre, carente de cérebros.
Além da questão ética, Paulo Renato está de olho em números assustadores: a cada ano, cresce o peso dos aposentados nos gastos do Ministério da Educação. Técnicos avaliam que, em pouco tempo, quase toda a receita será destinada aos inativos.
Tradução: os professores, em sua maioria progressistas e de discurso humanitário, beneficiam-se de um evidente privilégio, retirando recursos que poderiam ir ao ensino básico. Em essência, é o filho da lavadeira prejudicada pelo acadêmico.
A sorte das universidade é, pasme-se, a ignorância. A lavadeira (e a maioria dos líderes sindicais) não sabe que o país paga em média, por ano, US$ 7 mil para manter na universidade um filho da elite. E que gasta cerca de US$ 300 ao ano com um aluno do primeiro grau –ou seja, o filho da lavadeira.
O investimento em ensino superior seria, porém, largamente vantajoso caso produção universitária se voltasse às camadas mais pobres –o próprio ministro diz ter profundas dúvidas se a produção acadêmica hoje no Brasil, tirando as exceções de costume, tem essa prioridade.
PS – Um dos planos de Paulo Renato (ótimo, diga-se) é forçar o aluno universitária a pagar parte do dinheiro que recebeu prestando serviço nas comunidades pobres. Os médicos, por exemplo, dariam extraordinária ajuda nas regiões mais distantes, onde não existem sequer enfermeiros.

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