São Paulo, quinta-feira, 26 de janeiro de 1995
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As perplexidades de Covas

LUÍS NASSIF

Ninguém pode duvidar da angústia, provocada pela crise das finanças estaduais, que assoberba o novo governador paulista Mário Covas.
A reconstrução financeira e institucional de São Paulo é trabalho ciclópico, que exige imaginação e método. O governador está sinceramente convencido da necessidade de legislar para 32 milhões de paulistas. É meio caminho andado, porque coloca o interesse do cidadão como parâmetro básico das tomadas de decisão. Mas é insuficiente.
A cada dia que passa desabam sobre sua mesa dezenas de novos problemas. Se quiser resolver cada qual topicamente, sua mesa vai ficar cada vez mais atulhada e sua pressão cada vez mais alta. A saída será buscar soluções globais, que permitam limpar a mesa, desocupar-lhe o tempo para desincumbir-se das tarefas superiores da política. Mas como fazer?
Os desafios pela frente consistem em gerenciar eficientemente o Estado –sem dispor de quadros gerenciais– e pagar suas dívidas, recuperando sua capacidade de investimento –sem dispor de recursos.
O governador Covas só vai conseguir resolver sua perplexidade se completar a travessia conceitual da velha para a nova política, exorcizando-se de dois demônios que atormentam os políticos de boa vontade –como ele.
O primeiro é a questão do modelo gerencial e dos controles sobre o Estado. O governador acha possível substituir a equipe viciada dos outros anos por uma nova equipe, sem modificar o modelo gerencial do Estado. Julga ser possível ter controle pessoal sobre todos os atos do Executivo.
Na iniciativa privada, essa ilusão do controle absoluto costuma acometer empresas familiares. Metem-se a fiscalizar quinquilharias, a se incumbir de tarefas menores e perdem a visão de conjunto. Depois do primeiro enfarte, os empresários ganham sabedoria e começam a buscar caminhos mais inteligentes.
Percebem que não se pode conceber a estrutura administrativa como um todo. A moderna ciência administrativa é muito mais democrática e sofisticada. A empresa, e o Estado, têm que ser subdivididos em estruturas relativamente autônomas, cujo controle se dê através de processos informatizados, indicadores de produtividade e de custos.

Temores
É um processo que causa temor. Um deles é o da perda de controle sobre os atos do administrador. Previne-se com a indicação de administradores honestos, a definição de sistemas transparentes de informação –que permitam à comunidade exercer a fiscalização– e com conselhos formados por representantes dos cidadãos.
Surge o receio –não de todo infundado– de que esses conselhos possam ser tomados por seitas radicais. Mas se o governador tiver medo do embate político, fará melhor em mudar de profissão. Sua função política maior será a de se tornar o líder e propagandista maior desse novo modelo, mobilizando os cidadãos, conferindo-lhes responsabilidades e tornando-os co-autores da obra administrativa do Estado.
Se o modelo for bem desenhado e o trabalho político eficientemente desenvolvido, os próprios cidadãos tratarão de expulsar os oportunistas do conselho.
O segundo dogma a ser revisto é a questão patrimonial do Estado. Há uma crise financeira que tem que ser resolvida. Se não há saída fora da reforma patrimonial do Estado, que o governador supere suas perplexidades e ponha-se a trabalhar no modelo de privatização de suas estatais.
Se demorar muito, a perplexidade devorará o homem.

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