São Paulo, domingo, 29 de janeiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Ele se desfaz em sangue e e vômito negro"

NO AVIÃO, A CAMINHO DO HOSPITAL
"(...) (Charles Monet) pega o saco de vômito. Tosse profundamente e regurgita algo dentro. O saco incha. (...) Monet tem os lábios manchados de algo viscoso e vermelho, com gotas pretas, como se estivesse mastigando café moído. Tem os olhos cor de rubi e o rosto é uma inexpressiva massa de manchas vermelhas. Os pontos que surgiram há vários dias como manchas estreladas se expandiram e se unem formando grandes sombras de cor avermelhada: toda a cabeça está ficando preta e azul. Os músculos da face relaxaram. O tecido do rosto está se dissolvendo e a cara parece estar pendurada nos ossos que estão por trás, como se estivesse separada do crânio. Abre a boca e o vômito continua, interminável. Não se deterá, continuará vertendo líquido mesmo depois de o estômago estar vazio. O saco de viagem está cheio até a borda de uma substância chamada vômito negro. Não é na realidade preto, e sim de duas cores, preto e vermelho, uma mistura de grãos cor de alcatrão e sangue arterial. É uma hemorragia e cheira a matadouro. (...) Monet está rígido, como se qualquer movimento fosse romper algo interiormente. O sangue está coagulando: a circulação sanguínea vai arrastando coágulos e os coágulos vão se alojando em todo lugar. O fígado, os rins, os pulmões, as mãos, os pés e a cabeça começam a saturar-se de coágulos de sangue. De fato, ele está sofrendo uma apoplexia múltipla. Os coágulos se acumulam nos músculos intestinais, cortando o abastecimento de sangue aos intestinos. Os músculos intestinais morrem, os intestinos relaxam e se soltam. Monet não parece perceber a dor porque os coágulos alojados no cérebro bloqueiam a circulação, provocando pequenos ataques apopléticos. As lesões cerebrais apagam sua personalidade. (...) O sangue emana pelas narinas, um líquido arterial, brilhante e sem coágulos, que escorre pelos dentes e queixo."

NA SALA DE ESPERA
"(...) Monet fica em silêncio e espera que o chamem. Então, entra na última fase. A bomba de vírus explode. (...) Ele desmorona e se sente muito fraco, a coluna se dobra. Ele perde completamente o sentido do equilíbrio. O quarto gira. Monet está entrando em estado de choque. Está arrebentando. Não pode impedir. Cai para frente, com a cabeça entre os joelhos, vomita uma quantidade incrível de sangue que se esparrama pelo chão. O único barulho que se escuta é o da sua garganta, enquanto Monet continua vomitando, já inconsciente. Logo se escuta um barulho parecido ao de um lençol rasgando, que os intestinos produzem ao abrir o esfíncter e expulsar sangue pelo ânus. O sangue vai se misturado ao revestimento intestinal. Soltou-se das tripas. Monet arrebentou e se desfaz em sangue. Os demais pacientes levantam e se afastam do homem caído. As poças de sangue se estendem ao seu redor. Uma vez destruído o organismo anfitrião, o vírus sai por todos os orifícios, em busca de outros organismos."

Trecho extraído da versão espanhola do livro "The Hot Zone"/Tradução Claudia Rossi

Texto Anterior: "Sim, o Ebola pode chegar ao Brasil"
Próximo Texto: Rushdie de batom
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.