São Paulo, segunda-feira, 30 de janeiro de 1995
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Qual o problema de Mick rebolar até os 51 anos?

ANDRÉ FORASTIERI
ESPECIAL PARA A FOLHA

É fácil ver seu primeiro show dos Stones e decretar: "Eles ainda são a maior banda de todos os tempos" etc. É mais fácil ainda relegar os velhinhos ao papel de banda cover mais cara do mundo.
É fácil porque ambas as alternativas são verdadeiras. Especialmente a segunda, se você assistir "Voodoo Lounge" duas noites seguidas.
Não se engane: tudo que parece ser espontâneo, "visceral" e rock'n'roll no show é na verdade planejado até os minimíssimos detalhes (com um pequeno desvio-padrão: sábado não teve "Rocks Off" e "Midnight Rambler", teve "You Can't Always Get What You Want" e tal). Na manhã seguinte, não dá para ignorar o aspecto cabaré da coisa toda.
Nem sempre foi assim. Durante uns dez anos, os Stones realmente foram a maior banda de rock do mundo –a banda que duas gerações de pais mais detestaram
Bem que eu queria ter visto os Stones naquela época, qualquer show entre o Marquee, Altamont e a turnê de 75. Deve ter sido realmente emocionante ver uma bandinha de blues inglesa e desajeitada se tornar um perigo para a sociedade.
Os idiotas objetivos nunca entenderam essa moral toda dos Stones. Claro que eles nunca foram muito mais que uma excelente banda de bar. Mas a questão não é musical.
Como resumiu o meu amigo Rogério, os Stones eram os maiores porque eram os maiores encrenqueiros. Bandidagem, satanismo, militância, drogas, promiscuidade, viadagem –tudo que antes dos Stones queimava a fita de qualquer um, depois dos Stones se tornou obrigatório para todo candidato a rockstar.
Hoje eles estão calminhos e vivendo do passado. Pode muito bem ser que o conceito de Rolling Stones 95 seja uma aberração. Num mundo ideal, o avião teria caído com Jagger e cia. dentro em algum dia de 1969. Assim poderíamos idolatrar nossos heróis em paz, sem o constrangimento de assistir ao aparecimento das rugas e das carecas.
Ou talvez sejam mais honestos dinossauros tipo Pink Floyd, que assumem compartilhar da senilidade do seu público.
Mas se o que nossa sociedade propõe é a adolescência eterna, qual é o problema de rebolar até os 51 anos? Ninguém nunca viu Mick Jagger dizendo "hope I die before I get old". Se a única oportunidade que o Brasil teve de ver os Stones foi agora, paciência. Nem sempre a gente consegue o que quer.
No final das contas, o que interessa sobre essa história de envelhecer é como você gastou o seu tempo. Várias bandas foram muito mais sedutoras que os Stones e nos levaram para a cama. Profetas menos diletantes que Mick Jagger nos convenceram que não havia futuro e o negócio era sair quebrando tudo. Gente sombria nos iniciou no ocultismo, gente bêbada propôs que cair pela sarjeta era a única saída, gente cínica defendeu que ficar rico era a melhor vingança.
Mas ninguém fez tudo isso, ao mesmo tempo, e tão bem. Só os Rolling Stones, a maior banda de rock de todos os tempos.

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