São Paulo, segunda-feira, 30 de janeiro de 1995
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Rico Lins prepara seu retorno ao Brasil

KÁTIA CANTON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Rico Lins, 39, é daqueles artistas que estão sempre fazendo dez coisas ao mesmo tempo. Esta semana, por exemplo, as capas das revistas "Time" e "Businessweek" são criações dele.
O disco "Melting Pop", uma compilação de música brasileira lançada em Nova York, tem programação visual de Lins. E seus trabalhos que especificamente estampam o tema "Banana", estão reunidos numa megaexposição na Casa da Cultura do Mundo de Berlim, até 20 de fevereiro, onde outros 60 artistas internacionais dão suas visões sobre a fruta.
Nesse meio tempo, ele resolveu voltar definitivamente ao Brasil, depois de 17 anos vividos entre Europa e Estados Unidos.
Foi em Nova York que Lins ficou conhecido como um dos melhores artistas gráficos do mundo. Mas quando chegou lá, em 1987, para trabalhar como diretor de arte da "CBS Records", ele já trazia debaixo do braço um recheado currículo internacional. Somam-se seis anos de trabalho com design gráfico infantil em Paris a quatro fazendo cinema de animação no Royal College of Arts de Londres.
O reconhecimento definitivo veio na carreira independente nova-iorquina. Como ele gosta de dizer, os norte-americanos –leia-se editores da "Time", "Newsweek", "Washington Post", "New York Times"– pensam nele toda vez que vêem um ponto de interrogação visual pela frente.
Preparando sua nova vida brasileira a partir de abril, Lins contou, com exclusividade à Folha, o que ele tem que os norte-americanos e europeus não têm, e, em sua opinião, quais as perspectivas da arte gráfica no Brasil.

Folha - O que aconteceu com as artes gráficas no mundo?
Rico Lins - A informática. Essa é uma revolução maior do que a causada pela invenção da fotografia na pintura. Hoje, o importante é ter boas idéias e usar o computador como uma tesoura, um instrumento de recorte-e-cole. Fui caminhando a favor dessa maré. Nunca resisti a essa evolução.
Folha - Seu trabalho é brasileiro?
Rico Lins - Não faço ode à arara. Não sou chamado para criar imagens porque sou brasileiro. Mas, ao mesmo tempo, aproveito a capacidade de improviso, de pensar rápido, que é uma característica nossa. No Brasil, a informatização vem acontecendo num ritmo bom. O problema é que não há uma infra-estrutura que garanta a totalidade do trabalho. Então fica difícil exercitar a criatividade com a amplitude necessária. O resultado é amadorístico.
Folha - No momento em que muita gente critica a arte brasileira contemporânea de não ter uma "cara nacional", o que você acha de participar de uma coletiva cujo tema é banana?
Rico Lins - A banana, no caso da exposição em Berlim, tem mais um significado local de um bem de consumo raro. De qualquer jeito, a banana é um clichê tropical, que se tornou sinônimo de um Brasil caricatura, um Brasil agrícola-Carmen Miranda. E o clichê é ótimo quando bem usado.
Na exposição, mostro, por exemplo, uma bandeira brasileira, onde o verde é feito de lixo. No centro do azul, uma boca morde a banana criada por Andy Warhol. Aí a banana virou outra coisa, que não o ícone tropicalista.
Folha - O que você deseja fazer nessa volta ao Brasil?
Rico Lins - Quero amadurecer a questão da identidade cultural. Justamente, perceber o nosso lugar no mundo, desmistificando os lugares "Carmen Mirandas". Um bom meio será a propaganda.
No Brasil, ela tem sido monopolizada pelo texto. Nossos anúncios são ótimos, mas são todos narrativos. Quero trabalhar imagens que falem por si, criar um conceito visual que processe toda a informação necessária para se compreender um produto. Porque é na alta velocidade puramente visual que a informação se processa hoje no mundo.

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