São Paulo, terça-feira, 3 de outubro de 1995
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Divórcio fracassado

JANIO DE FREITAS

A política anda muito insossa, ou bem mais do que é normalmente, mas a vitória de Paes de Andrade sobre Alberto Goldman, para a presidência do PMDB, merece algumas considerações por seus efeitos importantes, até maiores nos planos do Planalto do que no próprio partido.
A intervenção do governo na disputa peemedebista, com forte investimento na candidatura de Alberto Goldman, não visava só a ter no maior dos partidos uma direção conduzida a partir do Planalto. Mais do que isso, o maior objetivo do governo nem era o PMDB: era o PFL.
O comando peessedebista, e nele sobretudo Fernando Henrique Cardoso, está surpreso com o fato de que o PFL não se revela tão dócil, em troca da participação no governo, quanto era esperado. Os pefelistas persistem em manter rumo próprio, são tão ou mais críticos do governo do que a chamada oposição e, mais competentes no fazer política do que os peessedebistas, emitem todas as evidências de que serão um obstáculo para as pretensões hegemônicas, e longamente hegemônicas, do PSDB com Fernando Henrique.
A par do relacionamento difícil com os pefelistas, no círculo de Fernando Henrique desenvolveu-se a idéia de que o governo, para compensar os desgastes públicos pelos aspectos negativos da política econômica tendentes a acentuar-se, deveria adotar ares mais à esquerda por intermédio do seu afastamento do PFL, já que não seria possível fazê-lo por modificações nas políticas de governo. É por aí que se entende a série de caneladas de Sérgio Motta e outros, sem motivos perceptíveis, nos seus aliados pefelistas.
Com a candidatura de Alberto Goldman, prosperaram no governo duas ilusões. Primeira, a da vitória. Outra, a de que a eleição no PMDB poria em ação o plano para dar as costas ao PFL. Assim: o PMDB domesticado seria conduzido a uma aliança consistente com o PSDB, o PPB e o PTB, tornando o PFL dispensável nas forças parlamentares governistas, com os peemedebistas ocupando nelas o lugar dos pefelistas.
A derrota de Goldman foi também, ou mais do que tudo, derrota do governo, condenando-o a manter a aliança com o PFL, pelo menos até que algum plano de divórcio dê certo. O PMDB presidido por Paes de Andrade não insinua posições imediatas muito diferentes da que teve até aqui em relação ao governo. O deputado Michel Temer, como líder do partido na Câmara, e o senador Jáder Barbalho, como líder no Senado, têm conseguido preservar uma posição respeitável do PMDB, mesmo quando integrando o apoio a projetos do governo. Mas é previsível, também, que o PMDB de Paes de Andrade venha a se tornar mais fiel a si mesmo, à sua imagem, ou ao que dela sobrevive. Se isso acontecer, o governo perderá mais alguma coisa, mas o ganho geral será grande e bom.

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