São Paulo, sábado, 7 de outubro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A marca real da modernidade

EDISON KEIJI YAMAMOTO

Estamos acostumados no Brasil a imaginar ou ter a certeza de que o governo federal resolverá todos os problemas da população. Esquecemos de que este país tem de ser feito de cidadãos, caso contrário não alcançará o Primeiro Mundo.
Primeiro Mundo não é ter acesso a produtos importados, mas é ter acesso a serviços básicos, como os de saúde. E em todos os países do Primeiro Mundo esse acesso é garantido, assim como discutido com relação à sua qualidade.
Isso não quer dizer que não haja problemas com os sistemas de saúde de certos países: existem, são colocados em discussão em todos os setores da sociedade, são votadas leis que regulamentam o sistema, e até o presidente de uma grande nação americana vem a público dizer que o sistema de saúde de seu país está em crise e tenta apresentar soluções.
A história política brasileira demonstra a nossa atração pela solução por meio de uma figura salvadora, que resolverá todos os problemas desta nação. No entanto o dia-a-dia de uma nação é feito por seus cidadãos, que têm suas casas, seus vizinhos e suas famílias em um espaço delimitado, que é o município. E é nesse espaço que tem de se dar a garantia do acesso aos serviços de saúde de qualidade.
Não há como negar que a história da organização política e administrativa sempre privilegiou a estrutura federal. É dessa prática que nascem as superestruturas federais que tudo podem e tudo resolvem. Resolvem?
Hoje, em quase toda a mídia, têm sido muito presentes notícias de fraudes no SUS (Sistema Único de Saúde) e de que o mesmo estaria falido e podre.
Por tudo que é noticiado de ruim, não temos a dimensão dos serviços ofertados pelo SUS: são mais de 1 milhão de internações por mês e mais de 120 milhões de procedimentos ambulatoriais por mês (de consultas à quimioterapia contra o câncer -de custos financeiros insuportáveis mesmo para pacientes da classe média alta).
O Ministério da Saúde, para garantir esses serviços a toda população, gasta menos de R$ 50/habitante por ano (a revista ``Veja São Paulo", em 2/8, publica matéria sobre oferta de planos de saúde para cães e gatos, e o preço da mensalidade mais barato para gatos é de R$ 14 ou R$ 168 por ano) -é isso mesmo, não houve inversão de valores.
O SUS está falido? Com a gama de serviços que oferece não é coerente fazer essa afirmação.
O SUS está em crise? Certamente.
Um dos grandes problemas dessa crise são as fraudes (que aliás ocorrem em outros sistemas de saúde privados ou de outros países). E o Ministério da Saúde tem tomado uma série de medidas tanto na área da auditoria eletrônica quanto na atuação de auditorias in loco, como acontece ou acontecerá, por exemplo, em três Estados com pessoal federal (assim como têm ocorrido várias auditorias rotineiras com pessoal estadual).
No entanto tanto a fraude como um outro problema de igual dimensão, a baixa qualidade do atendimento, somente serão sanados com a participação do cidadão em conjunto com os gestores locais do SUS.
A municipalização do sistema de saúde é o caminho, no sentido de que propicia essa participação da população, e tão-somente é ela que permitirá a coibição das fraudes no sistema. Essa é a marca da modernidade, a de que entramos no Primeiro Mundo.

Texto Anterior: Rompendo os vícios da saúde
Próximo Texto: Congresso; Mirândola; Era do despejo; Yom Kipur
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.