São Paulo, domingo, 8 de outubro de 1995
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Marcianos na reforma tributária

OSIRIS LOPES FILHO

Quem ler a exposição de motivos da reforma tributária e o texto da proposta de emenda constitucional enviada ao Congresso vai pensar que a obra é de marcianos.
Não se trata só de ação de extraterrestres. Há desconexão entre o alegado na apresentação -simplificação do sistema tributário, combate à sonegação, diminuição do custo Brasil e promoção de distribuição mais justa da carga tributária- e a proposta. Trabalho de alienados. Marcianos.
A ambição arrecadatória do governo federal está em toda a proposta. O centralismo tributário da União e a destruição da autonomia fiscal dos Estados compõem um quadro autoritário desfocado do ambiente democrático do país.
A técnica de montagem dos cenários usados pelo governo federal é fascista. Elegem-se bodes expiatórios para aglutinação de forças e execração dos culpados.
Alega-se que o desarranjo tributário dos Estados decorre da ``guerra fiscal". Urge acabar com esses conflitos. E, mais, o rombo dos Estados é provocado pela folha dos servidores públicos. É necessário demiti-los, atropelando o direito à estabilidade.
A armação é chocante. Conflita com os atuais tempos de liberdade. O núcleo de poder está imune aos ventos do diálogo. Não tem empatia com o povo. Age como todo-poderoso. Mas só para mexer na lei. Ação efetiva, nenhuma. Mudança de estruturas, realizações em benefício do povo, nada.
O tempo do povo não pode ser perdulário. Nem consumido tão egoísta e vaidosamente como faz a elite governante. O povo não está passivo, quer coisas elementares.
Habitação para os sem-teto. Terra para os sem-terra. Cadeia para os barões especuladores sem-cadeia (tubarões). Pátria para os dirigentes públicos sem-pátria, que ambicionam sinecuras nos órgãos internacionais.
Nesse quadro, um dos temas é a destruição da Federação. Pretende-se criar dois ICMS. Um federal e outro estadual. Ambos serão submetidos a uma única legislação, que, seguindo a racionália centralista, só poderia ser federal.
O Estado não mais poderá realizar política econômica ou social por meio do ICMS, perdendo sua autodeterminação. Só a União poderá fazê-lo. O seu passado não recomenda e o presente condena.
Pretende-se a simetria nacional no âmbito do ICMS. Do Rio Grande do Sul ao Amapá. Se o Piauí não puder mais oferecer isenções de ICMS para atrair investimentos, quem ganhará são os Estados centrais, que têm população, mercado, transportes, infra-estrutura. E a periferia? Nordeste, Norte e Centro-Oeste vão continuar como estão. Subdesenvolvidos.
O futuro ICMS vai provocar um novo processo de investimentos em São Paulo. A fábrica da Volkswagen a ser instalada em São Carlos é o primeiro passo.

OSIRIS DE AZEVEDO LOPES FILHO, 56, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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