São Paulo, domingo, 8 de outubro de 1995
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Desemprego: decifra-me ou devoro-te

ANTONIO KANDIR

Motivo de polêmica acesa e muito sofrimento nos últimos meses, o problema do desemprego vai muito além de oscilações cíclicas, potenciadas ou não pelo manejo específico das políticas fiscal e monetária. É engano, portanto, imaginar que o problema comece e se esgote nas medidas de restrição ao crédito adotadas pelo governo a partir de meados do primeiro semestre, agora já em processo de clara reversão.
A introdução de novas tecnologias mudou radicalmente a relação entre oferta de emprego e crescimento econômico. Isso significa que o problema do desemprego entrou para ficar na agenda dos problemas brasileiros neste final de século, mesmo na hipótese de que venhamos a crescer à taxa de 5% ou 6% ao ano.
Para enfrentá-lo, são necessárias medidas específicas, que vão desde políticas de estímulo a setores intensivos em mão-de-obra até investimentos em retreinamento e recolocação, passando por mudanças no capítulo dos encargos sociais, de modo a diminuir o custo indireto da mão-de-obra, sem prejuízo do salário real.
Outras medias importantes dizem respeito ao arcabouço institucional que regeu o mercado de trabalho e as relações sindicais entre empresários e trabalhadores no ciclo anterior de crescimento.
Com o novo paradigma tecnológico, esse arcabouço tornou-se disfuncional. A rigidez e o centralismo que lhe são característicos inibem a contratação formal de mão-de-obra, potenciando os problemas associados do desemprego e do subemprego, e dificultam ajustamentos a condições específicas de concorrência, ao nível das empresas, condição importante da competitividade numa economia globalizada em processo acelerado de mudança tecnológica.
Estamos, portanto, diante do imenso desafio de promover reformas institucionais que permitam ao país enfrentar em boas condições um problema que o crescimento por si só não é capaz de resolver. Frente à magnitude do desafio e tendo na memória a história remota e recente do capitalismo brasileiro, compreende-se o temor de que reformas nessa área produzam mais custos que benefícios aos trabalhadores.
Não se pode, entretanto, fazer as vezes de avestruz. A mudança do paradigma tecnológico tem caráter impositivo sobre as relações de produção, de modo que, não havendo mudança em seus aspectos institucionais, o ajuste se fará através de uma menor taxa de investimento e ainda menor oferta de emprego.
Estaríamos, pois, condenados a aceitar uma furiosa desregulamentação do mercado de trabalho como único remédio ao problema do desemprego estrutural?
De modo algum. Solução dessa natureza não interessaria nem aos trabalhadores, nem aos empresários, nem ao país, pelos danos que certamente causaria à produtividade, cada vez mais dependente de relações negociadas e cooperativas na resolução de conflitos e na divisão de custos e benefícios entre as partes envolvidas no processo de trabalho.
Indesejável, a desregulamentação furiosa do mercado de trabalho está, além disso, longe de ser a única alternativa à disposição. A experiência internacional quanto a formas e mecanismos de enfrentar o problema do desemprego estrutural é múltipla e varia conforme especificidades histórico-culturais de cada país.

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