São Paulo, domingo, 8 de outubro de 1995
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Sistemas bancários estão mudando de cara

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O capitalismo nasceu com os bancos. Antes da grande indústria, antes das grandes inovações tecnológicas e muito antes de inventarem a palavra ``globalização", os bancos já existiam. E já tinham uma tremenda vocação global.
A principal mudança no sistema financeiro mundial nos últimos anos tem sido justamente a transformação dos bancos.
Nos EUA, desde a crise de 29, o sistema financeiro convivia com divisórias, regulamentações que impediam, por exemplo, a fusão entre bancos comerciais e bancos de investimento.
Nos últimos 15 anos essas paredes foram sendo demolidas. Bancos de expressão regional começaram a ultrapassar essa limitação, numa onda de fusões e aquisições cada vez mais dinâmica.
Outra mudança é a importância crescente de fundos de investimento ou dos chamados investidores institucionais, entre outras instituições que não são bancos (seguradoras, por exemplo), mas que concorrem com os bancos.
No caso do Japão, os bancos armaram um jogo poderoso em que a especulação imobiliária servia de lastro para a especulação com outros ativos e para a acumulação de capital com alto endividamento.
A partir dos anos 80, dois fenômenos feriram de morte o processo. O primeiro foi a internacionalização das empresas japonesas que, acessando mercados de capitais externos, tornaram-se menos dependentes dos bancos nativos. O segundo foi o surgimento de uma economia de ``bolha especulativa", sinal de que as expectativas de retorno superavam em larga escala os limites do razoável.
O resultado chegou às manchetes de jornais nas últimas semanas. De um lado, aparecem como vítimas as instituições fragilizadas pela murchamento da bolha imobiliária. De outro lado, aparece uma grande fusão bancária consagrando como fronteira de sobrevivência o espaço global.

Ritmos latinos
Na América Latina, há três processos simultâneos em curso. O primeiro, talvez o mais grave hoje, é o desmonte do Estado desenvolvimentista. Voluntário apenas em parte, esse desmonte leva de roldão os bancos estatais, especialmente os de vocação regional (como na Argentina e no Brasil).
Agências como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) já se oferecem para auxiliar o processo de reforma e privatização desses bancos. Mas o custo político desse desmonte é evidente, surgindo daí impasses na reforma financeira.
Outra dificuldade dos latinos é adaptar seus bancos a um regime de inflação baixa e âncora cambial. A estabilização elimina os ganhos conhecidos como ``float" (o ganho puramente inflacionário).
A âncora cambial pode fragilizar bancos que não têm forte inserção internacional ou negócios solidamente comprometidos com os fluxos de comércio exterior.
Ao longo da estabilização com âncora ocorrem também processos de desnacionalização e dolarização das economias. Se as indústrias nesses países enfrentam uma concorrência externa crescente, não há por que imaginar que os bancos ficassem fora desse tipo de ajuste.

Finanças virtuais
Finalmente, há uma mudança que afeta os bancos do mundo inteiro: a virtualização das finanças.
O tipo de tecnologia e ``instalações" necessárias para crescer nesses mercados não são feitas de átomos, mas de ``bits" (informação que se pode transmitir por redes de computador). Em muitos países, a começar pelo Brasil, a tecnologia até está disponível, mas ainda há muito disso que se considera excesso de prédios e funcionários.
Atualmente, segundo a ``American Bankers Association", 61% das transações bancárias ocorrem entre quatro paredes. Em 1997, esse número terá caído para 44%.
Na América Latina, há uma combinação de todos esses fatores. A cara dos bancos está mudando e muitos vão perder a cabeça por causa disso.

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