São Paulo, domingo, 8 de outubro de 1995
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O novo mundo do trabalho

TARSO GENRO

As profundas modificações do sistema produtivo e a globalização econômica ``internacionalizaram" radicalmente as próprias demandas do campo, ligando a agricultura ao mercado mundial, integrando cada produtor rural ao sistema internacional de preços.
Tal fato também ``desnacionaliza" a questão agrária e exige maior precisão a respeito da natureza da reforma agrária que queremos, destruindo a ilusão romântica de uma agricultura de subsistência ou destinada exclusivamente ao abastecimento do mercado interno.
O operariado das fábricas da segunda revolução industrial continuará com um peso social considerável por muito tempo, mas sua tendência é esgotar-se como força política renovadora e como elemento central do processo produtivo com peso estratégico num futuro próximo. Além disso, a situação do desenvolvimento capitalista atual -gerando uma nova classe trabalhadora da ``sociedade do conhecimento" (estranha à cultura proletária tradicional)- também produziu uma exclusão social de proporções gigantescas.
As velhas alianças, nessa nova etapa histórica que elimina a possibilidade de políticas paroquiais para a esquerda, não têm mais do que um nobre significado moral. A aceitação resignada, por parte dos incluídos, de um dos salários mínimos mais vergonhosos da história do capitalismo brasileiro é um dos sintomas nacionais dessa fragmentação política e objetiva do mundo do trabalho.
Essa situação de barbárie tende a colocar como demanda social a segregação dos miseráveis, passível de ser petição de quaisquer das classes incluídas, sejam elas classes assalariadas ou não.
Finalmente, para uma estratégia consequente, devemos responder quais os setores da sociedade (além do apelo tradicional aos excluídos) que podem e devem ser mobilizados antes (para criar uma nova hegemonia) e depois (para dirigir o Estado e gerir politicamente a economia). O objetivo seria sustentar o novo programa para um novo patamar civilizatório voltado para organizar as bases integradoras da sociedade do conhecimento.
Manter-se junto ao proletariado clássico, sim, mas hoje buscar principalmente aqueles setores que compõem o novo mundo do trabalho -como exigência primária num projeto reformador moderno-, unificar os novos setores sociais emergentes da terceira revolução científico-tecnológica, com o mundo do trabalho (urbano e rural) do capitalismo tradicional. Fazer a ruptura da exclusão apontando para um novo patamar civilizatório na perspectiva do mundo do futuro e não simplesmente reformar a velha casa autárquica.
Os setores capazes de modernizar e dar novos padrões de produtividade ao velho modelo produtivo taylorista-fordista, vinculados ao mundo da informática, da eletrônica, das telecomunicações, da pesquisa científico-tecnológica, e a intelectualidade humanista, ameaçada de sedução pelo liberalismo, devem se constituir na espinha dorsal de um novo projeto de sociedade.
O programa deve estabelecer também clara articulação com os interesses do novo mundo dos empreendedores terceirizados, bem como com os empresários de médio e pequeno porte, cuja expansão está constrangida objetivamente pelo processo em curso acelerado de monopolização da economia.
Esses setores serão subsumidos e enquadrados no processo global de monopolização ou darão vitalidade a um novo modelo de desenvolvimento, apoiado na horizontalidade espontânea do capitalismo atual, que poderá desenhar um modelo de desenvolvimento econômico não-monopolista.
No caso do Brasil, para formar um arco de alianças que não permita a desagregação das vastas massas excluídas, o programa deverá ter como base das suas políticas públicas investimentos do Estado, a exemplo do que ocorreu no ``New Deal".
Só assim faremos uma reforma completa na infra-estrutura econômica e social do país, que está à beira de uma situação caótica: nas estradas, portos, sistema viário metropolitano, saneamento básico, habitação, saúde, com medidas capazes de criar as condições estratégicas para o desenvolvimento integrado do país e para uma inserção soberana no mundo globalizado.
Trata-se de disputar as características de um novo patamar civilizatório, com um novo tipo de Estado. A relação com os ``novos" excluídos -os miseráveis jogados à própria sorte pela onda neoliberal- só pode se dar com um programa de ``inclusão social", que seja ao mesmo tempo necessário e passível de ser regulado por decisões do Estado e que aponte para a superação do Estado atual -que subordina suas leis e decisões ao que é ditado pelos monopólios privados.

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