São Paulo, sábado, 14 de outubro de 1995
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Portugal muda Código Penal e incentiva penas alternativas

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

A necessidade de tornar as penas mais proporcionais aos delitos, aliada à dificuldade para pôr em prática a política criminal traçada pelo Código Penal de 1982, levou Portugal a reformular sua legislação criminal. A nova lei entrou em vigor no dia 1º de outubro último.
O desequilíbrio entre delito e punição era patente quando se comparavam os crimes patrimoniais e os crimes contra as pessoas.
Por exemplo, o furto de um espelho retrovisor lateral de um carro era punido com prisão de até dez anos. Já um estupro era punido, no máximo, com oito anos de prisão. Com a reforma, a pena máxima por estupro passou de 8 para 12 anos. O furto simples (do espelho do carro) ficou com três anos.
``A revisão agravou a pena dos principais crimes contra as pessoas. Nos crimes patrimoniais, na maioria dos casos, não houve redução da pena em si, mas uma diminuição dos casos em que se pode aplicar a pena máxima (dez anos de prisão)", informa Jorge de Figueiredo Dias, professor de Direito Penal da Universidade de Coimbra, que presidiu a comissão encarregada de reformar o código.
O Código Penal de 1982 introduziu as penas alternativas à prisão (como multa e prestação de serviços à comunidade) para os casos de menor gravidade.
Todavia, a nova sistemática não pegou. ``A lei não era muito clara sobre as condições para aplicar penas alternativas. Ao mesmo tempo, a mentalidade conservadora dos juízes demorou muito para converter-se a esse novo modelo de política criminal", avalia Dias.
O novo código amplia o número de casos em que se pode aplicar pena alternativa à prisão. Tirando os crimes contra as pessoas, todos os outros punidos com prisão de até três anos poderão receber multa como castigo.
Em comparação a outros países que adotam as penas alternativas à prisão, Portugal tem um índice muito pequeno de aplicação dessas punições. No Japão, mais de 90% das penas aplicadas são de multa. Na Alemanha e na Suécia esse percentual ultrapassa os 80%.
Em Portugal, o índice não chega a 50%. Nesses países, prisão inferior a seis meses praticamente deixou de existir. Em Portugal, cerca de 16% das penas de prisão aplicadas não superam esse prazo.
``Não é a ameaça de prisão que inibe a delinquência. Mas a certeza da punibilidade, ou seja, o delinquente tem de ter a certeza de que a punição vem e em tempo adequado", afirma Dias.
Agora, o novo código impõe que o tribunal dê preferência fundamentada à pena não privativa de liberdade ``sempre que ela se mostre suficiente para promover a recuperação social do delinquente e satisfaça as exigências de reprovação e prevenção do crime".
Os crimes sexuais receberam um novo tratamento. Deixaram de ser concebidos como crimes contra a moral e entraram na lista dos crimes contra as pessoas.
``Passaram a denominar-se crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, que são bens eminentemente pessoais", conta Dias. Estão nesse capítulo os crimes de assédio sexual, estupro, abuso e fraude sexual, dentre outros.
A versão atual do código português traz também alguns novos crimes, como gravação de conversa sem autorização, propaganda do suicídio, telefonemas para importunar, fraude informática, tortura, poluição e danos contra a natureza.

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