São Paulo, domingo, 15 de outubro de 1995
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Arafat vem pedir auxílio do Brasil para palestinos

JOSÉ ARBEX JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

O presidente da Autoridade Nacional Palestina, Iasser Arafat, 66, chega amanhã ao Brasil para uma visita de 24 horas. Em seguida, vai para Cartagena (Colômbia), onde participa no dia 18 da reunião de cúpula dos países não-alinhados.
O líder palestino será recebido no Brasil com todas as honrarias devidas a um chefe de Estado, incluindo um jantar que lhe será oferecido na terça-feira pelo presidente Fernando Henrique Cardoso.
Arafat espera que a visita impulsione a conclusão de acordos de cooperação e atraia investimentos no nascente mercado palestino.
O dia de Arafat no Brasil será intenso. Ele manterá encontros com os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal. Será também homenageado pelo governador do Distrito Federal, Christovam Buarque, com quem vai inaugurar o Monumento à Paz Mundial.
O líder palestino participará também de um coquetel oferecido pela comunidade árabe brasileira. Arafat deixa o Brasil à noite, após o jantar com o presidente.
Além do aspecto econômico, essa visita -a primeira que Arafat faz ao país- tem um grande significado político e simbólico, afirmou à Folha Musa Amer Odh, representante da delegação especial palestina no Brasil.
"Esperamos que a visita realce as relações cordiais que o Brasil sempre manteve com a nossa comunidade e ajude a lançar uma ponte econômica, cultural e social com a Palestina", disse Odh.
Hassan El Emleh, 57, presidente da Federação das Entidades Árabe-Palestinas Brasileiras, destaca o caráter geopolítico da visita.
"O Brasil é a principal potência da América Latina, e tende cada vez mais a ocupar o lugar que lhe é devido. Além disso, o país sempre desempenhou um papel importante na resolução dos grandes conflitos internacionais. Por tudo isso, a vinda de Arafat é da maior importância", disse El Emleh.
O Brasil, de sua parte, também mostra disposição em revitalizar seus laços econômicos e culturais com os países do Oriente Médio.
No começo de setembro, o chanceler Luiz Felipe Lampreia manteve encontros com o chanceler israelense, Shimon Peres, e com Arafat. Lampreia é defensor de uma política externa que acentue o caráter do Brasil como "global trader" (comerciante global), capaz de se projetar no mundo tanto como liderança regional quanto como parceiro internacional.
A nova Autoridade Palestina -consagrada pela assinatura dos acordos de 28 de setembro-, precisa, desesperadamente, de recursos. Ela está assentada, territorialmente, sobre a Faixa de Gaza (363 km2 e 658 mil habitantes) e Cisjordânia (5.880 km2 e 973 mil habitantes), onde a maioria da população vive em condições miseráveis, muitas vezes abarrotando acampamentos sem qualquer infra-estrutura urbana ou sanitária.
Parte da miséria se explica pelo fato de que durante os 28 anos em que manteve a ocupação dos territórios de Cisjordânia e Gaza, Israel não fez praticamente nenhum investimento produtivo na região.
O próprio Peres -um dos arquitetos do atual processo de paz na região-, reconhece que a situação de carência da maioria dos palestinos é, hoje, um dos principais obstáculos aos acordos de 1993. Para ele, "a miséria é o pai do fundamentalismo islâmico.
Isso, mais a presença de colonos judeus que não aceitam se retirar dos territórios ocupados, transformam Cisjordânia e Gaza num barril de pólvora muito propenso a explodir a qualquer momento.
É fácil entender, nesse quadro, os resultados de uma pesquisa recente do Centro de Investigação e Estudos da Palestina, segundo a qual 60% dos palestinos não crêem em paz duradoura.
A revitalização da economia é a chave para conferir a Arafat a legitimidade diante de seus críticos. É também fundamental para inibir as atividades do grupo fundamentalista Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) e de outras organizações extremistas, para quem o acordo foi uma "traição".
Finalmente, é a condição óbvia para que Arafat consolide aquele que é o seu objetivo estratégico: a criação de um Estado nacional palestino. Não existe Estado soberano sem uma economia minimamente significativa.
Não por acaso, ao visitar a França e o Reino Unido no final de setembro, Arafat fez um dramático apelo aos países da União Européia por investimentos na Palestina. Sua visita à América Latina também tem esse sentido.
Apesar das dificuldades, El Emleh mostra-se otimista. Ele lembra que, logo após o acordo de paz entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), em setembro de 93, áreas de Gaza e da Cisjordânia tiveram seu valor multiplicado por dez.
"Muitos palestinos querem voltar à sua terra e estão dispostos a investir. Agora é o momento certo", afirma El Emleh.
Há cerca de 40 mil palestinos e descendentes no Brasil (principalmente nos Estados do sul), e cerca de 600 mil na América Latina.
Em sua maioria, são empresários e comerciantes e de fé sunita (o principal ramo do islamismo). Eles representam um potencial econômico precioso para a pobre entidade nacional palestina.

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