São Paulo, segunda-feira, 16 de outubro de 1995 |
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Estreante é sucesso antes de chegar à livraria
JOSÉ GERALDO COUTO
É um falso livro de receitas, misturado com romance policial. Em primeira pessoa, um narrador descreve pratos e discorre sobre filosofia, arte e culinária, ao mesmo tempo em que semeia referências a alguns crimes e pistas que levam à identidade do criminoso. Nascido em Hamburgo e criado em Hong Kong, Lanchester, 33, doutorou-se em inglês em Oxford e assinou por três anos uma coluna sobre restaurantes no ``The Observer". Hoje edita o jornal literário ``London Review of Books". Cansado de badalação, aproveitou uma inesperada queda de energia que deixou parte da Feira de Livros de Frankfurt às escuras para sair do recinto do evento e conceder esta entrevista ao ar livre. Não se furtou a uma auto-ironia: ``Esse blecaute é um símbolo do que acontece na feira: as pessoas compram livros no escuro". Folha - Seu livro é um sucesso internacional antes mesmo de ser lançado. Como explica isso? Lanchester - É um fenômeno muito moderno, típico deste fim de século. Você diz que ele é um sucesso, mas ninguém o leu ainda. Só os editores. Diz-se que é um sucesso porque conseguiu ser vendido a muitos países, com grandes adiantamentos. Esses adiantamentos significam que são esperados muitos leitores. Mas eles são leitores virtuais, e todo mundo está cruzando os dedos para que venham a ser reais. Folha - Seu livro trata de uma gama variada de assuntos, e mistura vários gêneros: ensaio, guia, romance policial... O que veio primeiro? Lanchester - Parti da idéia de que os livros de culinária têm com frequência traços de autobiografia, falando mais sobre os autores do que eles mesmos sabem. Minha primeira idéia era: um autor pensa que escreve um livro de cozinha, mas na verdade ele se transforma em outra coisa. E que tipo de história seria essa? Teria que ser uma história de assassinato. Foi assim que fui construindo a estrutura do livro. Folha - O livro tem uma enorme quantidade de digressões sobre os mais variados assuntos. Lanchester - Desde o começo me sentia atraído pela idéia de uma estrutura que abrigasse uma grande quantidade de detalhes, informações. Gosto de livros que têm muito do mundo dentro deles. Folha - As receitas do livro são confiáveis? Lanchester - Espero que sim (risos). O engraçado é que, na receita que eu conheço melhor, o cozido irlandês, eu esqueci de colocar cebola, na primeira versão que mandei à editora. Por sorte, percebi a tempo de corrigir. Folha - O que você pensa da mistura entre ficção e ensaio operada por Umberto Eco? Lanchester - Adoro ``O Nome da Rosa", por seu caráter abrangente. Tem um pedaço do mundo ali. O maior romance do mundo, ``Em Busca do Tempo Perdido", é também um dos mais cheios de falhas e erros. Se Proust viesse tentar vendê-lo aqui, é provável que o mandá-lo embora. ``O quê? Um livro de 3.000 páginas em que o sujeito nunca sai da cama? Saia já daqui'" Texto Anterior: Editoras brasileiras compram no escuro Próximo Texto: Pinter retorna ao palco para fazer rir Índice |
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