São Paulo, sexta-feira, 20 de outubro de 1995
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Monteiro faz rir da 'Comédia de Deus

AMIR LABAKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

João César Monteiro, 56, é o mais iconoclasta diretor português em atividade. "A Comédia de Deus", vencedor do Grande Prêmio do Júri de Veneza-95, veio reforçar o título. Como sempre, ele dirige, escreve e interpreta, à moda Woody Allen e Nanni Moretti.
Pedofilia, fetichismo e escatologia temperam, em versão "light", "A Comédia de Deus" segundo Monteiro.
Ele faz João de Deus, gerente de uma sorveteria, para a qual cria também os mais originais sabores, através de receitas secretíssimas. Nas horas vagas, filosofa sarcasticamente sobre a vida e caça novos troféus para seu "Livro dos Pensamentos" -como chama seu álbum de tufos de pêlos pubianos femininos.
Banho de leite
Sorvetes vão, amantes vêm, João encanta-se com Joaninha, a angelical filha adolescente do açougueiro. Um longo ritual, que tem por apogeu um banho de leite, prepara a principal prova da nova conquista: mais um sabor para o cardápio da sorveteria.
O preço, desta vez, será alto.
"A Comédia de Deus" repete o estilo das demais comédias de costumes de Monteiro ("Recordações da Casa Amarela", "O Último Mergulho"). A trama se desenvolve lenta e episodicamente através de demorados planos-sequências e diálogos irônicos e trabalhados. Monteiro perde o público mas não perde a piada.
Por sorte, sua média é elevadíssima.

Desvios
Um pouco menos, reconheça-se, aqui. Em suas quase três horas, "A Comédia de Deus várias vezes perde o foco, tanto cômico quanto dramatúrgico, embrenhando-se por monótonos desvios.
É como se Monteiro testasse a efetiva fidelidade da platéia a seu universo autoral único. Seus filmes são ele: é pegar ou largar.
Apesar dos pesares, vale a aposta. "A Comédia de Deus diverte na maior parte do tempo e exala um saudável odor dionisíaco nestes repressivos anos 90.

Humor
Militante da incorreção política, João César Monteiro tem como melhor arma seu cultivado senso de humor.
Pena que seu novo filme aposente por vezes sua capacidade de autocrítica.

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