São Paulo, terça-feira, 31 de outubro de 1995
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O descalabro

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Ao qualificar como de "descalabro" a situação das contas públicas, o ministro da Fazenda, Pedro Malan, passa a impressão de que acaba de assumir o cargo e está fazendo o inventário de uma gestão anterior.
Pena que a atual equipe econômica, incluindo o seu chefe, o hoje presidente Fernando Henrique Cardoso, esteja no comando há dois anos e meio, desde que FHC assumiu a Fazenda.
Se, nesse período de 30 meses, tudo o que conseguiram produzir (ou não conseguiram evitar) é o "descalabro", em termos de contas públicas, não deixam a menor margem para otimismo para os 36 meses que lhes restam, certo?.
É claro que Malan deveria estar se referindo menos às contas da União e mais às dos Estados, que são as de fato calamitosas, mas a distinção, do ponto de vista da estabilidade, é irrelevante.
Pior: o governo joga para "as reformas" -que passou a ser uma espécie de "abre-te Sésamo" de uso universal- a perspectiva de uma estabilidade duradoura. Ora, todas as reformas já aprovadas no Congresso só terão efeito tangencial para a estabilidade. É o caso das mudanças no capítulo da Ordem Econômica da Constituição. Vão, no máximo, dar confiança aos investidores privados, internos e externos.
Mas é uma confiança volátil, como o prova o México, país que avançou mais do que o Brasil no mesmo tipo de reformas, mas nem por isso deixou de ser vítima de uma monumental crise de confiança.
O governo, aliás, está confessando, indiretamente, que "as reformas" até agora corrigem pouco ou nada o tal "descalabro" das contas públicas. Se não, como explicar o formidável empenho na prorrogação do FSE (Fundo Social de Emergência) com outro nome, seja qual for?
Com isso, o governo corre o risco de perder um elemento vital, a credibilidade na sua palavra. Antes, ai de quem se atrevesse a dizer que o fundo não era social nem de emergência. Ou de quem ousasse usar palavra tão forte como "descalabro" para descrever a situação das contas públicas.
Agora, o jargão oficial já incorpora essas verdades.

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