São Paulo, domingo, 5 de novembro de 1995
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Quantos empregos custa uma moda

GILBERTO DIMENSTEIN

Depois de provocar gigantescos traumas nos trabalhadores e em seus familiares, demitidos em nome de baixos custos e de alta produtividade, a moda da reengenharia sofre agora ataques por todos os lados. E apanha mais onde, óbvio, provocou mais vítimas: nos Estados Unidos surgem depoimentos de consultores arrependidos por aconselharem demissões em massa.
Arrependidos, vamos esclarecer, não pelos traumas humanos. Mas porque a empresa, depois de obter lucro a curto prazo, desmotivou seus funcionários, rompeu laços de confiança e perdeu vitalidade -portanto, perdeu dinheiro. "Demissões provocam depressão em pelo menos um terço dos demitidos, mas também em um terço dos que ficam", afirma Jerry Harvey, professor de administração da Universidade George Washington, que realizou pesquisa sobre depressão entre trabalhadores. "Nunca mais vão trabalhar com o mesmo ânimo, lealdade e excitação", acrescenta.
No Brasil, os efeitos desastrosos dos enxugamentos abruptos já aparecem em balanços. "Quantas bobagens, burrices e loucuras não foram cometidas e ainda são por causa de um modismo", lamenta Antoninho Marmo Trevisan, um dos mais importantes auditores de empresas brasileiros.
Na nova moda da reengenharia da reengenharia, um livro intitulado "Corporate Executions" ("ações de corporações") torna-se uma fonte de referência para administradores de empresas, empresários e acionistas. Por três motivos:
1) São analisadas grandes corporações (IBM, AT&T, Boeing, Xerox, General Electric, Ford) que se submeteram à reengenharia, mandando batalhões de funcionários para a rua;
2) O livro é lançado com o apoio da Associação Americana de Administradores de Empresas, ou seja, não tem nada de humanismo;
3) O autor, Alan Downs, ganhou muito dinheiro no passado, justamente assessorando empresas a fechar departamentos e demitir em massa para diminuir custos.
"O benefício é passageiro. Não se pode nunca perder a identificação dos funcionários com suas companhias", arrepende-se. Ele cita o exemplo da Kodak, que, depois de mandar 12 mil empregados embora, desde 1985, teve seu lucro reduzido pela metade.
Em contraposição, segundo Downs, prosperaram empresas como Hewlett-Packard ou Dow Química, que, nos tempos difíceis, optaram por congelar vagas, reduzir horário de trabalho e estimular aposentadorias voluntárias. "Muitas vezes, a melhor demissão a ser feita é a do consultor", ironiza Antoninho Marmo Trevisan.
PS - Trevisan lembra que num departamento de uma grande multinacional no Brasil o ânimo de um grupo de funcionários ficou abalado porque um dos demitidos era o capitão do time de futebol.

Uma ótima idéia a ser copiada no Brasil: escolas americanas introduzem um novo exercício em sala de aula. Os alunos aprendem a redigir cartas de protesto a empresas e homens públicos. Como parte do exercício, as empresas e os governos respondem.

Na sua conhecida modéstia, Paulo Maluf diz que sua popularidade pode ser vista em Nova York. "Entrei numa farmácia, reconheceram-me e só faltou me beijarem".
PS - Aliás, uma piada que correu na homenagem ao José Ermírio de Moraes quarta-feira à noite no Plaza: "Como se colocam juntos Paulo Maluf, José Serra e Fernando Henrique Cardoso dentro de uma garrafa de gênio?". Simples: basta desinflar o ego.

Uma das tradições mais admiráveis dos Estados Unidos é o envolvimento de empresários com a comunidade: multibilionários fazem doações às artes, ciências e filantropia. É assim que surgiram fundações com extraordinários serviços prestados.
Seguindo a tradição, Bill Gates, o americano mais rico, promete deixar 90% de sua fortuna, avaliada em US$ 12,9 bilhões, para entidades de caridade e de apoio à ciência e à tecnologia.

Paul Allen, ex-sócio de Gates, também fundador da Microsoft (muitíssimo mais interessante do que Gates), gasta milhões por ano em filantropia, esportes, construção de parques e bibliotecas públicas. Guitarrista, doou US$ 60 milhões para construir um museu em homenagem a Jimmy Hendrix.
Allen tem 42 anos. No ano passado, perdeu US$ 100 milhões por patrocinar idéias exóticas, apostando na criatividade. Não ficou mais pobre: com a recente valorização, suas ações na Microsoft atingiram US$ 2,4 bilhões.
Para quem não sabe, foi Paul Allen quem primeiro previu que o computador seria tão popular como o telefone, previu o correio eletrônico e apostou que, um dia, teríamos o "wired-world": os habitantes do planeta conectados por computador.

O smoking é um dos ingredientes rotineiros na paisagem de Nova York -impossível andar à noite pela cidade sem encontrar alguém vestido a rigor, graças, muitas vezes, às lojas que alugam roupas. Tanto que dizem que as festas são diferentes e os personagens, também, mas os ternos são sempre os mesmos. Revelo hoje um inacreditável truque do deputado Delfim Netto. Como detesta smoking e todos aqueles adornos, ele sempre se veste com um terno preto e acrescenta uma gravata borboleta para disfarçar, a exemplo do que fez quarta-feira à noite. E notem que ele estava sentado na mesa principal. Até hoje (ou pelo menos até esta coluna), nunca foi barrado.
Como se vê, não é à toa que ele foi tanto tempo ministro do Planejamento e da Fazenda.

Delfim se encontrou com dezenas de investidores, a quem disse: "Se não tiver nenhuma tragédia, o nome do próximo presidente da República é Fernando Henrique Cardoso". Sustentando essa suspeita, quinta-feira, em palestra no Wardolf Astoria, Affonso Celso Pastore, dizendo-se um reconhecido pessimista, comentou que não vê como a inflação pode subir nos próximos três anos.

PS - Sem a mesma ousadia criativa do deputado, fui obrigado a alugar um smoking. Pior do que o preço (US$ 125) e de ter de usar aqueles badulaques foi a reação do meu filho Marcos, de 7 anos. "Onde você vai, pai?", quis saber. "Tenho um trabalho no Plaza", respondi, cenário em que ele se considera íntimo por causa do filme "Esqueceram de Mim". Ele olhou com um ar preocupado e perguntou: "Você vai trabalhar lá como garçom?".

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