São Paulo, segunda-feira, 6 de novembro de 1995
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Leia a íntegra da exposição de motivos do ministro Pedro Malan sobre a MP

Esta é a íntegra da exposição de motivos sobre a medida provisória

Brasília, 3 de novembro de 1995.
Excelentíssimo senhor presidente da República,
Tenho a honra de submeter à elevada consideração de vossa excelência proposta de Medida Provisória que dispõe sobre o Programa de Reestruturação e Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional, a qual vem a complementar as relevantes medidas adotadas pelo Conselho Monetário Nacional em matéria de fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional e proteção da poupança popular.
2. Como é do conhecimento de vossa excelência, dentre as consequências danosas impostas pelo processo inflacionário que por longo tempo grassou em nosso país, destaca-se a queda dos níveis de eficiência de importantes setores de nossa economia que, ante a possibilidade de ganhos excepcionais nos mercados financeiros, relegaram por vezes a plano secundário suas principais atividades.
3. Se tal fenômeno ocorreu com a maioria das empresas industriais e comerciais do país, manifestou-se igualmente no caso das instituições financeiras. Com efeito, no âmbito do sistema financeiro nacional o processo inflacionário, ao possibilitar níveis excepcionais de receitas geradas quase que exclusivamente em operações realizadas com o trânsito ("float") de recursos, permitiu a expansão daquelas instituições, independentemente do grau de eficiência.
4. O aumento do número de instituições financeiras nos 12 meses que se seguiram à suspensão das barreiras para o livre acesso ao sistema financeiro e à permissão para a transformação de sociedades especializadas em instituições de atividades múltiplas -também conhecidas por bancos múltiplos- é indicação inequívoca dessa facilidade. Surgiram, no período, 73 novos bancos, múltiplos e comerciais, alguns dos quais vieram a revelar-se desprovidos do perfil ou capacidade técnica para o exercício das atividades próprias das instituições financeiras.
5. O Sistema Financeiro Nacional apresenta, atualmente, 256 bancos, entre múltiplos, comerciais e de investimentos, com mais de 16 mil agências distribuídas pelo país. Essas instituições possuem cerca de 11 mil postos de atendimento adicionais, excluindo os caixas eletrônicos. Esses dados não levam em consideração as caixas econômicas, que possuem mais de 1.800 agências e quase 500 pontos de atendimento.
6. Do ponto de vista operacional, por outro lado, o ambiente inflacionário fez com que a oferta de recursos, via financiamento de médio e longo prazos, se tornasse praticamente inexistente; para os agentes financeiros, mostrava-se mais compensador captar e aplicar recursos nos mercados de curtíssimo prazo, predominantemente em títulos públicos em grande volume direcionados ao financiamento do déficit público, que utilizar os recursos no exercício da função primordial das instituições financeiras, qual seja, a captação de recursos para aplicação em atividades produtivas.
7. No que diz respeito à supervisão prudencial exercida pelo Banco Central, as receitas inflacionárias auferidas antes da introdução do Real distorciam os dados contidos nas respectivas demonstrações financeiras, tendo em vista que o excesso de liquidez na economia era suficiente para financiar todo tipo de ativo, mesmo os de liquidação difícil. Como contrapartida, contudo, incorriam aquelas instituições em um processo contínuo e não facilmente perceptível de perda de capacidade técnico/operacional.
8. É preciso ressaltar, por outro lado, que os altos índices de inflação levaram as instituições financeiras a buscar novas e mais sofisticadas formas de aplicação de recursos, próprios e de seus clientes, sempre procurando maximizar seus ganhos, num esforço de minimizar os efeitos causados pela queda do poder aquisitivo da moeda. Este processo, se por um lado tornou o sistema financeiro brasileiro altamente ágil, com a absorção de novos e poderosos instrumentos financeiros, por outro lado determinou elevados investimentos, especificamente nas áreas de informática e comunicação. Estima-se que, somente entre 1993 e o primeiro semestre de 1995, o sistema tenha realizado investimentos, na área de informática e automação, da ordem de R$ 3,7 bilhões.
9. A nova conjuntura de estabilização econômica, a partir da implementação do Plano Real determinou profunda reversão do cenário até então existente, no que diz respeito à atuação das instituições financeiras.
10. Atualmente, as instituições do sistema financeiro buscam ganhos de escala em suas operações, o que leva a maior segmentação do mercado e posturas definidas de atuação. Não mais persistem as condições propícias à atuação daquelas instituições não perfeitamente habilitadas, técnicas e patrimonialmente, à prática efetiva de operações bancárias cada vez mais sofisticadas. As instituições atacadistas, atuando num segmento altamente competitivo, terão que estar aptas a satisfazer demandas num mercado mais seletivo e não padronizado. Os bancos do tipo varejista, por sua vez, tendem a concentrar-se em operações de crédito e na cobrança de tarifas na prestação de serviços, e não mais com os ganhos obtidos com o "float" no mercado. Para tanto, devem ser transparentes os preços dos serviços a serem cobrados dos clientes que os utilizam.
Acrescente-se a isto o processo de globalização dos mercados pelo qual passam as principais economias mundiais e que está a determinar níveis de competitividade entre as instituições em escalas nunca antes verificadas.
11. Esse substancial conjunto de mudanças no ambiente em que atuam as instituições financeiras, como ressaltado na Exposição de Motivos nº 311, de 23 de agosto próximo passado, traz, como reflexo imediato, a necessidade de criação de condições para que essas instituições possam adaptar-se ao novo ambiente econômico e de mercado, ações que devem ser vistas no contexto da função do Estado, exercida pelo Banco Central, de zelar pela solvência das instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, protegendo os investimentos e a poupança da sociedade.
12. É neste sentido, com efeito, que tem atuado o Banco Central. Destacam-se as ações de saneamento do Sistema Financeiro Nacional: desde a implantação da atual fase do Plano Real, em 1º de julho do ano passado, foi decretada a intervenção, liquidação extraordinária ou regime de administração especial em 21 bancos múltiplos e comerciais.
13. Este processo, todavia, sempre traz transtornos à população, principalmente ao segmento de menor poder aquisitivo. Por este motivo, visando resguardar os interesses de depositantes e investidores, em especial aqueles com recursos limitados para aplicação no Sistema Financeiro, o Conselho Monetário Nacional autorizou, através da resolução nº 2.197, de 31 de agosto de 1995, a constituição de entidade privada, sem fins lucrativos, destinada a administrar mecanismo de proteção a titulares de créditos contra instituições financeiras, para cobrir riscos decorrentes de situações de intervenção ou liquidação extrajudicial. Ressalte-se que tais medidas normativas têm caráter transitório, até que seja regulamentado o dispositivo constante do artigo 192 da Constituição Federal determinando a criação de fundo ou seguro objetivando proteger a economia popular.
14. Foi em continuidade às providências no sentido do desenvolvimento e fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional que o governo federal, através do Conselho Monetário Nacional, instituiu o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional, com base na competência contida na Lei 4.595, de 31 de dezembro de 1964.
15. O Programa contempla a criação de linhas especiais de crédito, e estabelece importantes medidas de incentivo à reorganização administrativa, societária e operacional das instituições que atuam nos mercados financeiro e de capitais, mediante fusões, incorporações, cisões, desimobilizações, ou qualquer outra forma de reestruturação societária e operacional. Com isto, permite que sejam alcançados os padrões de eficiência e competitividade presentemente requeridos nos planos doméstico e internacional, preservando os interesses da sociedade.
16. É no contexto desse conjunto de medidas que tendem a fortalecer o Sistema Financeiro Nacional e proteger a poupança popular que se insere a Medida Provisória ora submetida à consideração de vossa excelência. O texto legal proposto prevê que o Programa de Reestruturação e Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional será executado através de operações de reorganização administrativa, operacional e societária, e abrangerá o Sistema de Proteção a Titulares de Crédito contra Instituições Financeiras, instituído pela Resolução nº 2.197, de 31.08.95, do Conselho Monetário Nacional.
17. Como forma de incentivar iniciativas de reestruturação necessárias ao fortalecimento e modernização do sistema, o texto da Medida Provisória traz providências de ordem tributária. Assim, a Medida Provisória permite a amortização do ágio decorrente da diferença entre o valor pelo qual houver sido adquirida a participação societária na instituição incorporada e seu valor patrimonial. O mecanismo possibilita que o ágio seja integralmente amortizado, sujeitando-se, todavia, aos mesmos limites de dedução dos prejuízos fiscais: 30% da base de cálculo do imposto de renda. Observe-se que o tratamento tributário instituído na Medida Provisória aplica-se unicamente às incorporações realizadas até 31 de dezembro de 1996, e condiciona-se à associação da instituição incorporadora a entidade administradora do mecanismo de proteção a titulares de créditos contra instituições financeiras, objeto da Resolução nº 2.197, do Conselho Monetário Nacional. Por fim, a Medida Provisória afasta a aplicação dos artigos 230 e 254, parágrafo 1º, da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1975.
18. A Medida Provisória ora submetida à consideração de vossa excelência objetiva portanto, através das medidas acima descritas, incentivar operações de mercado, consistentes em reestruturações societárias, como etapa natural do processo de redefinição e adaptação do Sistema Financeiro Nacional ao novo ambiente de estabilidade econômica. Neste sentido, as instituições aqui instaladas estarão seguindo tendência observada em mercados financeiros de outros países, e certamente precedendo ações semelhantes que virão a ocorrer em outros países. Ressalte-se, neste particular, que as medidas de natureza tributária contempladas na Medida Provisória, bem como as demais medidas objeto de regulamentação expedida pelo Conselho Monetário Nacional, estendem-se não somente àquelas instituições que se encontram nos regimes especiais de intervenção, liquidação e administração especial temporária, previstos respectivamente na Lei nº 6.024, de 13 de março de 1974, e no Decreto-lei nº 2.321, de 25 de fevereiro de 1987, como também, de forma geral, a todas as instituições integrantes do Sistema Financeiro que venham a envolver-se em programas de reorganização societária.
Convicto, portanto, da urgência e relevância de tais providências, submeto à elevada apreciação de vossa excelência a anexa minuta de Medida Provisória.
Respeitosamente,
Pedro Sampaio Malan
Ministro de Estado da Fazenda

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