São Paulo, segunda-feira, 6 de novembro de 1995
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Atentado deve fortalecer processo de paz

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

O assassinato de Yitzhak Rabin é mais um exemplo de um antigo absurdo que eleva à galeria dos grandes homens personalidades como Mahatma Gandhi ou Martin Luther King -ser vítima exatamente do veneno social que combatem.
Mas o resultado final do absurdo é positivo: apesar de mortos, ficam ainda mais fortes. Daí que o atentado em Tel Aviv, praticado por um fanático religioso, é capaz de ajudar ainda mais o processo de paz no Oriente Médio -essa era a visão que predominava ontem entre os principais pensadores de política externa dentro e fora do governo dos Estados Unidos.
Na lógica do absurdo, políticos como Rabin, Gandhi, Anuar Sadat, pregam compreensão e tolerância, mas morrem por causa do fanatismo; pregam o pacifismo, mas são alvos da violência. No final, porém, transformados em mártires, viram referência indestrutível no imaginário popular.
Nos Estados Unidos, Robert Kennedy notabilizou-se pela defesa dos direitos civis e pelo fim da guerra do Vietnã. Era visto como um futuro presidente que iria terminar a mesma guerra que sua família, por meio de Jonh Kennedy, começou. Até que levou um tiro e, assim, tornou-se mais um dos símbolos do pacifismo que, anos depois, sairia vitorioso.
Com o tiro somado ao Prêmio Nobel da Paz, Rabin substitui ou pelo menos compete no imaginário popular com Ben Gurion, o grande estadista de Israel, responsável pela Guerra da Independência. O imaginário do povo judeu tem raízes nos profetas bíblicos.
O fato de o assassinato vir logo depois de uma manifestação em que Rabin entoava canções pacifistas e pedia que se desse uma chance à paz apenas reforça com ingredientes de dramaturgia a construção de um mito.
Pelo menos neste momento, a direita, cujo maior líder é Binyamin Netanyahu, do Likud, entra na defensiva. Eles não se opuseram ao clima histérico que dominou grupos religiosos devido aos mais recentes acordos de paz.
Em raivosas manifestações, Rabin era chamado de "traidor. E, mesmo neste momento, em meio à comoção, religiosos radicais justificaram de certa forma o atentado, enfatizando que ele pagava um preço por não seguir a Torá -o livro sagrado judeu.
O Likud se manteve em silêncio, de olho nas eleições marcadas para o próximo ano, em novembro -desta vez, com novas normas, o primeiro-ministro é escolhido separadamente por voto direto. Até então, se votava no partido; o majoritário indicava o primeiro-ministro.
O prestígio de Netanyahu vinha crescendo à medida que, em Israel, surgiam dúvidas sobre o ritmo do processo de paz com os árabes. Na agenda de Rabin, estava, por exemplo, devolver as colinas do Golã aos sírios. O líder do Likud vocalizava essa insatisfação.
Apesar de concordarem que, imediatamente, a paz é beneficiada, diplomatas especialistas em Oriente Médio levantam dúvidas sobre sua durabilidade. Rabin tinha o carisma de ser um herói de guerra; portanto, com mais autoridade moral para falar em temas de segurança.
Não se sabe se o chanceler Shimon Peres, um diplomata sofisticado, vai conseguir reproduzir essa sensação de segurança. O problema é que os radicais árabes, que festejam a morte de Rabin, tendem a acirrar os ataques terroristas, forçando maior conflito -e, assim, maior reação da opinião pública israelense.

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