São Paulo, quinta-feira, 9 de novembro de 1995
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O BC e a crise bancária

LUÍS NASSIF

Cálculos extra-oficiais do mercado dão conta de que a conta da viúva no sistema bancário chega a US$ 12 bilhões, parte bancada pelo Banco do Brasil, parte pelo redesconto do Banco Central. Na imagem do ex-ministro Mário Henrique Simonsen, o BC conseguiu criar a dívida mobiliária 2 -uma conta enorme que se soma ao gigantesco passivo gerado por essa política monetária irracional.
Há um quadro confuso pela frente. Com base nas estatísticas, o BC julga que os índices de inadimplência recuaram. Na verdade, houve só uma pausa.
Oscilações irresponsáveis na política de crédito criaram uma ciranda de inadimplência sem precedentes. Empresas devem para empresas, que devem para empresas, sem que ninguém consiga cobrar de ninguém.
Esses pactos de não-cobrança têm vida curta. Neste momento, há um sem-número de grandes empresas feridas de morte pelas mudanças bruscas das condições de crédito e que poderão soçobrar nos próximos meses, fragilizando ainda mais a situação.
Por outro lado, o fato da provisão para devedores duvidosos não ser dedutível da receita tributável faz com que os balanços não reflitam a situação real dos bancos. Sem clareza, qualquer episódio acaba sendo motivo para pânicos, que agravam a situação.
O Banco Central tem a obrigação de impedir que bancos quebrem. Primeiro, para proteger correntistas. Segundo, para prevenir crises bancárias, fenômenos de fuga de recursos que levam à quebra bancos podres e bancos bons. Mas em hipótese alguma a salvação dos bancos pode ser confundida com a salvação de seus controladores.
O programa de reestruturação bancária lançado nesta semana pode ser eficiente para resolver uma questão ou outra. Não resolve no global e é injusto para com o contribuinte.
Se a compra de um banco que vale xis for feita com crédito subsidiado e vantagens fiscais, parte desse ganho será apropriada pelo vendedor -em última instância, responsável pelo banco, tenha sido vítima ou não da política monetária.
Há dois outros caminhos extremamente danosos para a viúva. O primeiro, o do redesconto (linha de crédito que o BC oferece para contornar problemas temporários de falta de caixa dos bancos). O banco entra no redesconto -como ocorreu com o Econômico- e, se estoura mais à frente, o rombo já está estatizado. O segundo caminho é o da liquidação pura e simples, procedimento traumático que pune os correntistas menos informados e amplia a crise de confiança.
O caminho correto seria o da intervenção temporária. Entra-se no banco com data marcada para sair e se desapropriam ações dos controladores, ou eles são mantidos até cessar a intervenção.
Se o problema é mera questão de liquidez, ao assumir o banco seu risco passa a ser o risco BC -e não haverá mais motivos para corridas. Passado o problema, devolve-se o banco aos seus controladores.
Se o problema for maior, responsabilizem-se os controladores e busquem-se saídas que minimizem o prejuízo público -sem prejudicar pequenos correntistas e sem ampliar a crise de confiança no sistema.
Pelo fato de não ter agido assim no caso Econômico, o BC não pode continuar empurrando a crise com a barriga. O ministro Malan pode repetir enquanto quiser que não existe crise. O que não é acreditar no que diz.
Alertas
A coluna alertou em abril, maio, junho e julho para a irresponsabilidade da política monetária. Por seus porta-vozes na imprensa, o governo preferiu repetir que não havia crise e atribuir as críticas a lobbies de forças econômicas.
Sugere-se aos colegas que entraram na conversa oficial e trataram a questão como matéria de fé que reflitam agora sobre sua responsabilidade individual nesse desastre que ameaça o futuro do Real -que, com seu espírito acrítico, eles diziam defender.

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