São Paulo, segunda-feira, 13 de novembro de 1995
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'Como nós, roqueiros são discriminados'

PAULO CIPASSÉ XAVANTE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Foi uma experiência muito nova e muito positiva para o povo Xavante da aldeia de Pimentel Barbosa receber aqui o pessoal da banda Sepultura -o Igor, o Max, o Andreas e o Paulinho- para um trabalho musical conjunto de gravação para o próximo disco da banda que tem o nome significativo de "Roots" (raízes).
Quando nós fomos consultados pelo pessoal da gravadora Roadrunner e do Núcleo de Cultura Indígena sobre essa possibilidade de gravação, nós todos ficamos muito felizes com a oportunidade de dar prosseguimento a nosso trabalho musical.
Porque o que fazemos com música e com outros produtos culturais é uma maneira de expressar nossa vontade de contato com o mundo, de tocar o coração das pessoas e ampliar nossos aliados.
Faz parte de nosso caminho, dentro da tradição, escolher nosso próprio destino.
A aldeia não conhecia o Sepultura. Todo mundo ficou muito curioso, queriam saber o que era um roqueiro. Nós tínhamos visto fotos e sabíamos que eles eram "diferentes", com cabelos compridos e com pinturas no corpo e que eles também, como nós -os índios-, sofrem preconceito e discriminação.
Mas quando eles chegaram foram logo se integrando, se pintando como nós, cantando e dançando debaixo do sol quente... Foi uma perfeita integração.
Depois da gravação para a faixa do disco, eles tocaram uma música que fizeram em homenagem aos nossos parentes Kaiwá, do Mato Grosso do Sul, e foi muito bonito, muito forte mesmo.
O pessoal da aldeia aplaudiu muito e pediu "mais um". Deu para sentir que eles fizeram a música com o coração. E o trabalho de gravação também foi assim, forte, com o coração.
A música que escolhemos para gravar é de uma cerimônia de cura. É uma forma de expressar nosso desejo de que o mundo restabeleça seu equilíbrio e harmonia e de que as pessoas sejam tolerantes e abertas, que haja respeito pela filosofia e expressão de cada indivíduo, cada grupo, cada povo, cada nação.
Outra alegria para nós foi de saber que a banda decidiu gravar em Pimentel Barbosa também porque conheceram nosso trabalho musical -o CD "Etenhiritipá" e o videoclipe que fizemos no ano passado.
Esse reconhecimento pelo trabalho do povo Xavante é motivo de orgulho para nós e deve servir de exemplo para nossos parentes também mostrarem sua cultura, a beleza e a força da tradição indígena.

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