São Paulo, quarta-feira, 15 de novembro de 1995
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Line doce line

GILBERTO DIMENSTEIN

A tecnologia ameaça extinguir a secular e fundamentada suspeita de que garoto brincando na rua em horário de escola só podia estar "matando aula".
O casamento do computador com a linha telefônica transforma as residências em extensão do escritório e produz uma inovação no movimento matinal das cidades -até pouco tempo atrás marmanjo que não saísse de manhã para trabalhar era desempregado ou, dependendo do bairro, delinquente. Agora, as casas ameaçam virar também sala de aula.
Diante dos avanços da informática, foi encaixada na galeria de previsões nos Estados Unidos uma idéia que, há alguns anos, seria apontada como maluquice: o fim da escola.
Pelo menos 500 mil crianças (fala-se até em 1,5 milhão) nos Estados Unidos estudam apenas em casa, ensinadas pelos pais ou com auxílio de professores particulares. Elas são devidamente registradas no distrito educacional e não estão impedidas de entrar na faculdade.
Sistemas multimídia facilitam o aprendizado, ao misturar texto, imagem e som: ano a ano as enciclopédias estão mais animadas. Não apenas mais interessantes, mas, convertidas em on-line, são atualizadas mensalmente.
A Internet dá acesso a todos os bancos de dados e troca de informações entre alunos dentro e fora do país. É mais interessante aprender sobre o apartheid conversando com um estudante da África do Sul. Ou tirar uma dúvida de biologia consultando, on-line, um PhD no assunto.
Para se avaliar a rapidez do movimento em direção à informação computadorizada basta citar um fato: até janeiro deste ano, havia nos EUA cem jornais on-line. Este mês o número saltou para mais de 510. Todos estão desenvolvendo seções educacionais. "The Wall Street Journal", mais influente jornal de economia dos Estados Unidos, está entre eles e muda suas edições a cada hora. Ao ler uma notícia sobre uma empresa é possível acompanhar sua cotação na bolsa de valores.
Para completar, propagam-se professores on-line que tiram dúvidas em todas as matérias. Já existem escolas que, além de vender CDs educativos, oferecem acompanhamento aos alunos, orientando à distância seu aprendizado e ajudando os pais. Impulsionado pelo tecnologia, cresce nos Estados Unidos um movimento batizado de "home school" (escola em casa), onde o aluno faz de seu quarto a escola, escolhendo seu próprio horário.
PS - Por trás dessa volúpia on-line (compras on-line, rezas on-line, sexo on-line) há um comportamento socialmente doente, a tentativa de substituir o contato humano. Do jeito que andam, vão transformar a realidade em fantasia virtual, manipulada por um bando de neuróticos solitários diante da tela de um computador.

Cidade em que, não raro, cachorro é tratado como gente e gente como cachorro, Nova York vive um escândalo na polícia por causa de um beagle chamado Fred. Dois policiais foram demitidos, acusados de maltratar o animal. No fervor do debate, apareceram estatísticas e estudos psicológicos sobre o perfil de quem agride animais -eles seriam mais propensos a bater na mulher ou virar assassinos.
PS - No Brasil, já daríamos um gigantesco passo se: 1) evitássemos que os policiais matassem arbitrariamente pessoas; 2) se matassem, tivessem, no mínimo, a mesma punição dos agressores do beagle nova-iorquino.

Outra punição que estamos longe de ver acontecer no Brasil -tão longe como a punição de pessoas que maltratam animais: o Ministério da Justiça norte-americano divulgou esta semana que, nos últimos cinco anos, colocou na cadeia 3.700 executivos por fraudarem o sistema financeiro.

Em Nova York para participar como observador de sessões na ONU, o líder do governo na Câmara, Luís Carlos Santos, diz não estar muito satisfeito com o Palácio do Planalto. Ele imagina que o presidente Fernando Henrique Cardoso vai acabar se arrependendo por não indicar um coordenador político dentro do governo: "Não dá para ser juiz, goleiro, zagueiro e atacante ao mesmo tempo".
PS - Irritado mesmo ele está com o lançamento dentro do governo da tese da reeleição: "estupidez e "infantilidade política". "Jamais se deveria falar nesse assunto a quatro anos da eleição". Diante das reações no Congresso, a idéia, segundo ele, ficou para 1997 -isso se, até lá, o "goleiro" não levar um frango.

Surpresa para as aguerridas (e muitas vezes histéricas) feministas daqui. Cresce o número de homens que reclamam serem assediados sexualmente por mulheres nos locais de trabalho.
Um levantamento conduzido pelo governo federal em seus departamentos e agências informa que 19% dos homens sofreram o que imaginam ser assédio sexual. Assédio, aqui, vai da piada a um convite para jantar, um olhar mais detido ao corpo e até ao estupro. Note-se: o suposto abuso não foi cometido pela chefe, mas por uma colega de trabalho.
PS - A verdade é que o exagero do politicamente correto misturado ao fervor moralista puritano está conferindo status sociológico à panaquice.

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