São Paulo, quarta-feira, 15 de novembro de 1995
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Os maias

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Desde os tempos de Estácio de Sá, o Rio dá a impressão de nunca estar pronto. Apesar disso, tivemos em nossa história dois momentos, um deles poderia ser o definitivo: o de Pereira Passos, durante o governo de Rodrigues Alves. O outro, bem menor em volume e importância, seria o de Carlos Lacerda/Negrão de Lima, que não eram prefeitos, mas governadores da Guanabara e tiveram autonomia para realizar alguns planos substanciais. (Por sinal, foram dois adversários políticos, quase saiu sangue entre eles.)
Temos agora um projeto ou intenção de projeto que está custando R$ 220 milhões e outros tantos de paciência e bom humor do carioca. É uma iniciativa do alcaide Maia, cuja melhor idéia, até agora, foi a de ignorar o horário de verão e dar ao Rio o horário que ele achou mais conveniente.
Tecnicamente, o plano é um desfile da vaidade profissional de alguns arquitetos. Sortearam entre si alguns bairros e cada qual está mexendo nas calçadas, nos postes de sinalização e demais penduricalhos, em uma tarefa mais de vitrinista do que de arquiteto.
Nem se discute a inexistente oportunidade do trabalho. Qualquer carioca, dos tamoios para cá, sabe onde estão os problemas. Discute-se o trabalho em si, sua dispendiosa inutilidade: outros prefeitos e outros vitrinistas fatalmente mexerão no que está sendo feito agora: o Rio nunca ficará pronto.
Ainda bem que a beleza da cidade não dependeu nunca de prefeitos, arquitetos e vitrinistas. Se assim fora, o Rio seria um monstrengo -aliás, está começando a parecer um "frankenstein" urbanístico: os pedaços de decoração que está recebendo revelam e acentuam essa monstruosidade.
E há também a suspeita de que todo esse dinheiro, todo esse transtorno, tem por finalidade principal a instalação da rede subterrânea para uma TV a cabo. É o dinheiro do contribuinte pagando a fatura de um interesse particular. Um pagamento duplo: em dinheiro mesmo e em desconforto no presente e mau gosto no futuro.

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