São Paulo, sexta-feira, 24 de novembro de 1995
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Graziano é o culpado, conclui Planalto

RUI NOGUEIRA; GABRIELA WOLTHERS

Jobim cobra explicações de presidente do Incra e pede a procurador-geral investigação contra Júlio César
RUI NOGUEIRA
Coordenador de Produção da Sucursal de Brasília
O Palácio do Planalto não tem mais dúvida: foi Francisco Graziano, então chefe de gabinete do presidente Fernando Henrique Cardoso e atual superintendente do Incra, quem pediu à PF (Polícia Federal) a investigação que levou ao "grampeamento" do telefone do embaixador Júlio César Gomes dos Santos, chefe do cerimonial da Presidência.
Por atender a um pedido informal de Graziano, o diretor da PF, Vicente Chelotti, escondeu a investigação do ministro da Justiça, Nelson Jobim. A disposição ontem do governo era demitir Graziano e Chelotti tão logo Jobim termine a investigação.
A permanência de Chelotti é considerada insustentável pelo Palácio do Planalto, que já procura um substituto para a direção da PF. Ontem, chegou-se a cogitar o nome do vice-governador do Ceará, Moroni Torgan (PSDB).
Ex-delegado da PF, sua nomeação foi praticamente descartada após a constatação de que ele não poderia pedir licença do cargo, mas teria de renunciar.
A investigação interna foi decidida depois que o chefe do Cerimonial e o ministro da Aeronáutica, Mauro Gandra, se demitiram na semana passada. A Folha apurou que FHC esperava que Graziano também pedisse demissão.
O presidente do Incra, por sua vez, disse que não pretende se demitir do cargo. "Não tem por que ele se demitir. Em nenhum momento participou desse grampo", declarou o assessor de imprensa de Graziano, Augusto Fonseca.
Hoje, o ministro da Justiça encaminha a Graziano um ofício pedindo que explique como conseguiu o resumo da transcrição das fitas com as escutas telefônicas na casa de Júlio César. "O presidente sabe de tudo o que estou fazendo", disse o ministro da Justiça.
Foi Graziano, segundo Jobim, quem, no dia 9 de novembro, uma quinta-feira, em uma audiência no fim do dia, no Planalto, entre 17h30 e 18h30, entregou ao presidente o resumo da transcrição das escutas telefônicas. Ao entregar o documento, Graziano disse que o tinha conseguido com os seus "amigos da Polícia Federal".
Ontem, às 20h, Jobim também encaminhou ao procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, o pedido de abertura de uma investigação de Júlio César.
O ofício com o pedido de explicações a Graziano vai funcionar como uma espécie de acareação entre ele e Chelotti. Ontem, Jobim encaminhou a Chelotti um questionário com 22 perguntas pedindo resposta para o que o relatório de anteontem deixou de explicar.
O relatório de Chelotti a Jobim repete a versão divulgada desde o início da semana pela PF, segundo a qual a escuta telefônica foi pedida à Justiça para investigar denúncias anônimas, envolvendo um "certo Júlio César, vulgo JC".
O documento é tão inconsistente que Jobim encaminhou ontem o novo questionário a Chelotti e deu prazo até hoje, ao final da tarde, para que seja todo respondido.
Jobim quer saber, por exemplo, por que a PF não identificou os telefonemas anônimos que ela diz ter recebido "insistentemente". "Bastava usar aquele aparelho que registra a origem dos telefonemas, o Bina", disse ontem o ministro.
O ministro da Justiça também está cobrando da PF uma explicação para o fato de o delegado Oliveira Santos ter levado 11 dias para saber que Júlio César era o chefe do cerimonial do Planalto.
A outra contradição levantada está no fato de a PF informar que o embaixador "tinha ligações com países como EUA, França, e as cidades de Corumbá, Várzea Grande, Rio de Janeiro e São Paulo", pontos de rota do tráfico de drogas e, mesmo assim, pedir autorização para escuta a um juiz estadual em vez de um juiz Federal.
Questionado sobre a demora do governo em agir, o ministro justificou a prudência argumentando que "não faz nada fora de um processo por escrito. Tudo tem de ser testemunhado e formalizado. É isso que legitima uma decisão futura". Para Jobim, a discussão sobre o "grampo" e a investigação da PF se impuseram à denúncia de tráfico de influência envolvendo o chefe do cerimonial, Júlio César, porque a ação da PF criou "sensação de desproteção" na sociedade.

Colaborou GABRIELA WOLTHERS, da Sucursal de Brasília

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