São Paulo, quinta-feira, 30 de novembro de 1995
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Televisão virou cúmplice dos estúdios

DANIELA FALCÃO
DE NOVA YORK

Cinema e televisão convivem pacificamente há muito tempo. Pelo menos nos Estados Unidos. A maior prova é o último relatório divulgado pela Motion Pictures Association of America (órgão que reúne os estúdios de cinema) sobre os filmes mais assistidos e a ocupação das salas de projeção.
Em 1994, foram produzidos 420 filmes (a média é de 380) e vendidos 1,3 bilhão de ingressos. Como os EUA têm uma população de 260 milhões, isso significa que cada americano foi em média ao cinema pelo menos cinco vezes no último ano.
Nada mal para um país onde as pessoas permanecem diariamente quatro horas em frente a um aparelho de televisão.
Quem ainda duvida do sucesso do casamento entre telinha e telona ficará surpreso em saber que os donos dos grandes estúdios de cinema (e de boa parte dos pequenos) são também os proprietários das maiores redes de TV aberta e de TV paga. E que os mesmos estúdios que produzem os filmes que vão para a telona são responsáveis pelos seriados e pelas famosas "soap operas" (teatro humorístico ou novelas americanas).
A união entre TV e cinema ficou ainda mais sólida este ano por um fenômeno de ordem empresarial: a aceleração das fusões que tomou conta da indústria de entretenimento dos Estados Unidos.
Os dois grandes exemplos estão na fusão da Walt Disney Company (gigante do cinema) com a Capital Cities Incorporation (dona de 11 estações de TV) e da Time Warner (cinema) com a TBS (Turner Broadcasting System).
Antes de se juntar a Capital Cities, a Disney já tinha quatro TVs pagas, além de seus quatro estúdios de cinema (Disney Pictures, Touchstone Pictures, Hollywood Pictures e Miramax Films).
Com a fusão, ela passou a ser proprietária também da rede de TV ABC -uma das mais poderosas dos Estados Unidos- e outras dez estações que, juntas, detêm 25% do mercado norte-americano. E ainda levou de quebra participações em quatro canais pagos nos EUA (ESPN, ESPN 2, A&E-TV e Lifetime TV) e outros no Japão, Alemanha, França, Inglaterra e Escandinávia.
A fusão da Time Warner com a TBS sepultou as últimas dúvidas sobre a eficácia da união entre produtores de filmes para a TV e estúdios de cinema.
O novo império de comunicações (o maior do mundo hoje) conta com os mais poderosos canais pagos do país (como HBO, CNN, TBS), e com cinco estúdios de cinema (Warner Bros. Studios, Castle Rock Enterteinement, New Line Cinema, Hanna-Barbera Cartoons e Turner Pictures).
Não bastasse o controle da produção de filmes, a Time Warner agora tem também uma das maiores distribuidoras de videos nos EUA, a Warner Bros. Home Video.
Apesar de a TV pode não ser mais encarada como a inimiga número um do cinema, isso não sigifica que, com as fusões, os estúdios estejam vivendo uma época de euforia.
O custo das produções tem aumentado anualmente, exigindo investimentos cada vez maiores. O orçamento médio dos filmes produzidos em 1994 foi de US$ 34 milhões, três vezes maior do que os produtores gastavam no início da década de 80.
"A crise na indústria do cinema não é mais causada pela TV. Ao contrário, é a TV muitas vezes quem gera o lucro necessário para que se possa investir nas produções cinematográficas. Só que, um dia, a fonte vai secar", afirma Richard Zanuck, um dos mais importantes dirigentes da indústria de cinema de Hollywood.
Zanuck é produtor independente há 30 anos (entre os filmes que produziu estão "Conduzindo Miss Daisy" e a série "Tubarão") e já exerceu diversos cargos de direção nos estúdios, inclusive o de presidente da Twentieth Century Fox (entre 1962 e 1970).
"Falo com conhecimento de causa. Se o custo dos filmes continuar crescendo no ritmo atual, vai chegar uma hora em que ninguém terá de onde tirar dinheiro", afirma Zanuck.
Uma das maiores críticas do produtor é dirigida ao cachê pago hoje às grandes estrelas.
"É um absurdo pagarem US$ 20 milhões a Jim Carrey para fazer a sequência de 'Ace Ventura'. Mesmo que o filme atraia milhões de pessoas às salas de cinema. Acho ele um ótimo ator, mas se você tem que pagar US$ 20 milhões só para uma pessoa, o filme vai sair, no mínimo, por US$ 60 milhões."
Para compensar o gasto com o cachê de Carrey em "Ace Ventura 2", a Time Warner vinculou o filme a seus maiores sucessos na TV, como "Barrados no Baile" e "O Quinteto". Resultado: as duas séries viraram co-patrocinadoras do filme.
"A Time Warner só pode gastar tanto porque é um império na TV e na música. Se atuasse apenas no cinema, não poderia arcar com esses caprichos dos atores", afirma Zanuck.

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