São Paulo, quinta-feira, 30 de novembro de 1995
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Trótski foi protagonista de dramalhão mexicano

Trótski numa foto de 1940

EDSON FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

País exportador de dramalhões novelescos, o México foi palco de um assassinato que nenhum roteirista poderia imaginar: o de Leon Trótski (1879-1940), um dos líderes da Revolução Russa de 1917.
Às 17h30 do dia 20 de agosto de 1940, o agente stalinista Ramón Mercader saiu de um hotel no centro da capital mexicana e foi a Goyoacán, subúrbio da Cidade do México, onde ficava a mansão-fortaleza que Trótski dividia com a mulher, Natalia Sedova, o neto, Estevan Sedov, e uma legião de seguranças.
Passar pela segurança era um problema que Mercader havia resolvido meses antes, ao ficar noivo da trotskista norte-americana Silvia Angeloff.
Com a confiança da família conquistada, Mercader adentrou a mansão e, no caminho até o escritório de Trótski, parou para conversar com Natalia, que estranhou a capa de chuva que o visitante carregava. O céu estava claro.
Enquanto Trótski lia um documento que Mercader trouxera, este retirou uma picareta de alpinista do bolso da capa e desferiu um golpe com a parte chata da ferramenta na cabeça de Trótski.
Em uma conversa com seu irmão, Luis, Mercader descreveu assim a cena que seguiu ao golpe. "Em vez de cair fulminado, como eu esperava, Trótski soltou um grito terrível e penetrante".
Mesmo com uma perfuração de sete centímetros na cabeça, Trótski atirou objetos contra o agressor que foi preso imediatamente pelos seguranças. Trótski ainda salvou a vida de seu algoz pedindo para que os seguranças não o matassem enquanto Mercader não confessasse quem era o mandante do crime.
A reação de Trótski estragou o plano de fuga de Mercader. Sua mãe, Caridad, que arquitetou a trama, o esperava em um carro estacionado próximo à mansão.
Mercader jamais confessou quem dera a ordem para a execução de Trótski. Cumpriu 20 anos de prisão no México e, em 1961, foi condecorado como "herói da URSS" pelo dirigente Nikita Khruschov.
Mas o "herói" passou a ser um "peso morto" para o governo soviético e teve sua identidade modificada pelos agentes de Stálin, até mesmo nos livros de registros de Barcelona, cidade onde nasceu.
A partir de 1974, Mercader tornou-se amigo íntimo de Fidel Castro, de quem ganhou uma luxuosa mansão em Havana.
Morreu quatro anos depois na capital cubana e teve suas cinzas transportadas em um vôo especial até Moscou. Sua lápide no cemitério de Kuznetsovo diz: "Ramón Ivanovitch López, herói da União Soviética".
Relação passional
Os problemas de relacionamento entre Trótski e o poder soviético começaram muito antes do atentado no México.
Já em 1900 ele havia sido deportado para a Sibéria, de onde escapou dois anos depois com o falso nome de Trótski (seu nome de verdadeiro era Lev Davidovich Bronstein). Esse apelido vinha de um carcereiro alemão que manteve Trótski sob guarda em Odessa.
Apesar de ter sido um dos principais líderes da Revolução Russa, Trótski teve sua participação no governo impedida pela ascensão de Stálin, que o proibiu de falar em público desde 1925.
Quatro anos mais tarde foi banido da URSS. Viveu exilado na Turquia, França e no México, onde chegou em 1937.
(EF)

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