São Paulo, sábado, 2 de dezembro de 1995
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A geopolítica do petróleo

ADIEL GOMES DE ARAÚJO

"O jogo econômico não impede guerras e conflitos, e frequentemente a economia tem de ceder lugar às realidades geopolíticas."
(Roberto Campos, Folha de 19/02/95)

O Congresso Nacional prepara-se para regulamentar o setor de petróleo no Brasil, após a aprovação da emenda constitucional do governo que "flexibiliza" o setor.
Evidentemente, não podemos abrir mão de conquistas históricas da sociedade brasileira nem tampouco permitir a vulnerabilidade energética do país no setor -por suas características, altamente cartelizado/oligopolizado em todo o mundo.
Devemos evitar que aconteça no Brasil o que ocorreu na Argentina, onde a desregulamentação e privatização da YPF trouxe a oligopolização (Esso, Shell e YPF dominam 90% do mercado), os preços aumentaram, há desinteresse na realização de investimentos de riscos e as reservas existentes, exploradas de forma predatória, estão declinando.
Daí a importância de considerarmos a geopolítica do petróleo. Sobretudo porque, na atual conjuntura, os países ricos procuram petróleo desesperadamente e no cenário da globalização há disputas até irracionais por hegemonia entre as nações, a exemplo da França, que contraria acordos internacionais e insiste em fazer testes nucleares.
Em relação ao petróleo, a situação é crítica para os países desenvolvidos. Os EUA, com reservas para seis anos, importam cerca de 50% do seu consumo; o Japão importa 99%, Alemanha 96%, Itália e França 94%. Esses países praticamente não têm reservas e têm urgência em resolver seus problemas na área de petróleo. Utilizam seu poderio militar para garantir fontes de suprimento, como na guerra do golfo Pérsico, que matou 238 mil pessoas e custou às forças aliadas US$ 60 bilhões. Não é por acaso que mantêm bases militares na região.
O petróleo e o gás natural representam 52% da demanda de energia do mundo. Os grandes produtores mundiais integram a Opep e, em sua maioria, localizam-se no Oriente Médio, uma área explosiva politicamente. Dominam 77% das reservas mundiais, de 1 trilhão de barris (a Arábia Saudita tem 25,6%; Iraque, 9,9%; Kwait, 9,3%; Irã, 9,2%; Emirados Árabes, 9,2%; seguem Líbia, Nigéria, Argélia, Venezuela e México), enquanto todos os demais países do mundo (entre eles o G-7, que consome 75% da demanda mundial) ficam com os 23% restantes.
Aliás, a criação da Opep e dos monopólios estatais do petróleo no México, Venezuela e Brasil foi uma reação aos oligopólios dos países grandes consumidores e tirou o domínio das multinacionais, que detinham grandes áreas e concessões para muitos anos no Oriente Médio, África e América do Sul. As "sete irmãs" (Esso, Chevron, Mobil, Gulf, Texaco, Shell e British Petroleum), dividiam o mundo do petróleo com mais duas empresas, as estatais Elf da França e Eni da Itália.
Na atualidade, os países ricos garantem o seu suprimento de petróleo e o controle de reservas em outros países por meio das suas empresas transnacionais, cujos interesses em assegurar mercado e suprimento se confundem com os interesses nacionais e ainda colaboram na política externa.
Entretanto, as 22 maiores empresas privadas transnacionais têm apenas 4,5% das reservas mundiais, enquanto as 28 maiores estatais do mundo dominam 83%.
Walter Teagle, presidente da Standard Oil, disse certa vez: "Seria razoável exigir dos EUA que se esgotem imprudentemente suas próprias fontes de aprovisionamento? A indústria petrolífera americana não pode aceitar semelhante solução. Ao contrário, deve procurar desenvolver-se no estrangeiro para dotar produção nacional de novos suprimentos de petróleo. A produção nacional já não é bastante para cobrir as necessidades internas. Urge, pois, que os produtores americanos atuem a fim de desenvolver nos países estrangeiros recursos petroleiros".
O Brasil está numa posição confortável em relação a petróleo. Tem a 15ª maior empresa do mundo, a Petrobrás, com reservas de 10 bilhões de barris descobertos (20 anos de consumo), que valem US$ 130 bilhões; 5,1 bilhões de barris delimitados e exploráveis; 20 bilhões de barris como potencial geológico; um patrimônio industrial com 11 refinarias (refina 1,5 milhão de barris/dia), que valem US$ 50 bilhões; 9.273 km de dutos; 77 navios petroleiros; líder mundial em produção em águas profundas, reconhecida e premiada pela Offshore Technology Conference nos EUA.
A Petrobrás fatura US$ 20 bilhões/ano e em 1994 teve um lucro líquido de US$ 1,7 bilhão. Nos seus 42 anos de existência. sempre garantiu o suprimento nacional. Investiu desde sua criação, em 03/10/53, US$ 82 bilhões, enquanto todas as multinacionais existentes no país, juntas, investiram US$ 72 bilhões desde o ano de 1900. A programação plurianual de investimentos da companhia prevê para os anos de 95 a 99 investimentos de US$ 23 bilhões em exploração, produção, refino e transporte.
Por tudo isso, há a necessidade de manter o status atual da Petrobrás como empresa de economia mista, eficiente, e ainda fortalecer as suas condições de competitividade, para que a produtividade da empresa seja, de fato, direcionada em benefício da sociedade brasileira. Para tanto, deve ser administrada de acordo com os verdadeiros princípios da qualidade total, a começar pelo da responsabilidade pública.

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