São Paulo, domingo, 3 de dezembro de 1995
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Ministros de 3 países debatem economia

CLÓVIS ROSSI
DA REPORTAGEM LOCAL

A Folha inaugura amanhã o seu novo Centro Tecnológico Gráfico oferecendo aos convidados um autêntico coquetel de planos de estabilização da economia, prévio ao coquetel propriamente dito, de praxe nessas ocasiões.
O seminário internacional "Estabilização e Mercados Emergentes", que antecede a inauguração, reunirá a partir de 9h30 os ministros Pedro Malan (Fazenda) e José Serra (Planejamento), do Brasil, Domingo Cavallo, da Argentina, e o vice-ministro da Fazenda do México, José Julián Sidaoui.
O coquetel estará inevitavelmente composto por expressões como "efeito Orloff" ou "efeito tequila", dado o temor de que a crise mexicana contamine a situação tanto na Argentina como no Brasil (o "tequila"). Ou de que problemas na Argentina se reproduzam do outro lado da fronteira (o "Orloff").
Afinal, Argentina, Brasil e México conduzem planos de estabilização que têm ao menos uma característica comum: apóiam-se fortemente no que se convencionou chamar de âncora cambial.
Traduzindo: a moeda local em relação ao dólar fica ou congelada (caso da Argentina desde abril de 1991) ou valorizada (casos do México, até a crise de dezembro de 1994, e do Brasil até agora).
Em consequência e também como decorrência da abertura da economia -outra característica comum aos programas dos três países-, os importados entram a preços relativamente baixos.
Com isso, os similares nacionais têm seus preços contidos em um patamar relativamente baixo ou até se reduzem, levando alguns setores ao limiar da quebradeira.
A contrapartida dos importados baratos surge na conta comercial, ou seja, na diferença entre o que o país exporta e o que importa.
Os três países, em grande medida por culpa do câmbio, passaram a importar mais do que exportar. Esse déficit comercial era ou ainda é coberto pela entrada de capitais externos, na maior parte de curto prazo, o que disfarçava ou ainda disfarça problemas no comércio.
Quando o México entrou em crise, incapaz de sustentar o mecanismo por mais tempo, todo o modelo ficou sob suspeição.
Mas as autoridades brasileiras mal disfarçaram a satisfação com o "timing" da crise mexicana: funcionou como sinal de alarme emitido antes que o déficit na balança comercial se tornasse mais difícil de reverter.
A Argentina não teve tempo de comemorar o alarme, pois o "efeito tequila" se fez sentir agudamente, na forma, por exemplo, de fuga de capitais e retirada maciça de depósitos nos bancos locais.
A oposição e até parcelas do empresariado argentino criticam, no entanto, o que batizaram de "Brasil-dependência", expressão que designa a suposição de que a economia argentina se tornou "viciada" na do vizinho maior.
A Argentina, diz a crítica, só não naufragou, na esteira da crise mexicana, porque foi içada pelo Brasil -ou mais exatamente pelo Plano Real.
Tenham ou não razão os críticos, o fato evidente é que a globalização da economia torna cada vez mais difícil analisar a situação de um país isoladamente, sem considerar o que está acontecendo com os seus principais parceiros.
A suposição da equipe econômica brasileira, como a Folha apurou, era a de que uma eventual queda de Cavallo desataria nova tempestade sobre os mercados emergentes, afetando o Brasil.
Até pelo lado do crescimento econômico e seu efeito sobre o emprego, há lições a estudar de um lado e do outro da fronteira.
O caso argentino é inteiramente atípico: nos quatro primeiros anos do plano de estabilização (91 a 94), a economia cresceu 33% -a uma média anual, portanto, de 8%, um índice asiático.
Não obstante, o desemprego conheceu explosão idêntica: quase triplicou no período, atingindo agora 18% da força de trabalho, um índice politicamente difícil de sustentar a médio ou longo prazo.
No Brasil, a expansão econômica que se seguiu à introdução do real permitiu a redução do desemprego. Mas os freios ao consumo aplicados pela equipe econômica acabaram por eliminar todos os ganhos anteriores e ainda destruir mais alguns postos de trabalho.
Em contrapartida, se se olhar os dois planos de estabilização apenas pelo lado da inflação, são êxitos inegáveis. A inflação argentina acumulada nos 12 meses até outubro foi de magérrimos 2,2%.
No Brasil, admite até o Desep (Departamento de Estudos Socioeconômicos e Políticos da CUT, o braço sindical do partido que mais critica o governo, o PT):
"A inflação permanecerá em torno de 1% a 1,5% ao mês, podendo mesmo ficar abaixo disso".
É esse coquetel de efeitos cruzados, de números luminosos e inquietantes, que estará à mesa do seminário a se realizar no auditório do novo Centro Tecnológico Gráfico-Folha.

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