São Paulo, domingo, 3 de dezembro de 1995
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Agonia do IR

OSIRIS LOPES FILHO

As alterações encaminhadas pelo governo ao Congresso, sobre Imposto de Renda, evidenciam preferência em favor das pessoas jurídicas e arrocho em relação às pessoas físicas. A atuação do governo privilegia o econômico e despreza o social, traindo compromissos da campanha de FHC.
Reconheça-se algumas características no projeto de lei alterando o IR da pessoa física. Não adota explicitamente a tese da proporcionalidade do tributo, recuando da tentativa de eliminar a sua progressividade, estabelecida na Constituição, substituindo-a por alíquota única. Também não retira a alíquota de 35%, que alcança os contribuintes de altas rendas.
Mas consagra uma injustiça que acentua o fato de que tal imposto incide efetivamente sobre rendas do trabalho, assalariado e do profissional autônomo.
É iníqua uma tabela de fonte, cuja alíquota inicial seja de 15%, alcançando rendimentos mensais entre R$ 900,00 e R$ 1.800,00. A intensidade dessa carga é tão pesada que atenta contra a capacidade contributiva, tendo característica confiscatória.
Antes foi dito que não se atreveu abraçar descaradamente a proporcionalidade. Isso foi feito maquiavelicamente. A segunda faixa da tabela é de largo espectro. Abrange rendimentos acima de R$ 1.800,00 até R$ 16.200,00, submetidos a uma alíquota de 25%.
A faixa inicial é de uma magreza dietética, pelo resultado obtido. Assim, a sua esmagadora concentração vai se localizar na faixa correspondente aos rendimentos acima de R$ 1.800,00 até R$ 16.000,00, aplicando-se, portanto, a alíquota de 25% sobre a maioria dos contribuintes do imposto.
Existe a informação de que apenas 12 mil contribuintes, em 1995, tiveram seus rendimentos submetidos à alíquota de 35%, que, pela nova tabela, abarca os rendimentos acima de R$ 16.200,00. Se correta a informação, demonstra um quadro vergonhoso de evasão e a impotência da administração tributária de revertê-lo.
Mantido tudo como está, no exercício de 1996 haverá uma diminuição dos contribuintes na alíquota de 35%. Prevê-se uma nova hipótese de dedução: "as contribuições para entidades de previdência privada domiciliadas no país, cujo ônus tenha sido do contribuinte, destinadas a custear benefícios complementares assemelhados aos da Previdência Social".
Os contribuintes mais afortunados em renda, os ricos, devem estar contentes, principalmente os que se preocupam com uma aposentadoria tranquila, coberta por proventos da previdência privada.
As suas contribuições para tal previdência não têm limites, para efeito da dedução do IR. Sua situação é privilegiada diante dos contribuintes com filhos nas escolas. As deduções por despesas escolares têm um limite anual irrisório de R$ 1.500,00 por dependente. Além disso, a dedução ficou mais estreita, pois considera-se apenas "os pagamentos efetuados a estabelecimentos de ensino relativamente à educação regular de 1º, 2º e 3º graus". Outros gastos educacionais, como cursos de língua e aulas de reforço ficam de fora. Despesas com maternal e jardim de infância também.
A opção governamental é clara. Incentivo às empresas de previdência privada, garantia de boa aposentadoria para os ricos, restrições à educação e impostos nos assalariados.

OSIRIS DE AZEVEDO LOPES FILHO, 56, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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