São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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FHC suspeita de conspiração de assessores

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso suspeita que esteja sendo vítima de um complô. Uma trama patrocinada por pessoas de seu próprio governo. Acha que o vazamento dos dados sigilosos da já famosa pasta cor-de-rosa teve o objetivo de prejudicá-lo, enredando seu governo em nova crise.
A pasta de cartolina rosada, encontrada na sede do Banco Econômico em agosto, estava sob a guarda do Banco Central havia três meses e meio.
Contém listas de políticos supostamente beneficiados, na campanha de 1990, com doações irregulares do Econômico, hoje sob intervenção do BC.
O presidente envolveu-se pessoalmente na administração da nova crise. Na noite da última quinta-feira, recebeu no Palácio da Alvorada um irado Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA).
O nome de ACM consta da pasta. É mencionado ao lado de outros políticos de peso, entre os quais dois ministros do atual governo -José Serra (Planejamento) e Gustavo Krause (Meio Ambiente)-, além dos presidentes do Congresso, senador José Sarney (PMDB-AP), e da Câmara, deputado Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA).
Na conversa com o presidente, iniciada por volta de 19h30, ACM foi direto: "Isso é contra mim".
Fernando Henrique interrompeu-o: "Ora, Antônio Carlos, você acha que isso é contra você? Não. Isso é contra mim. O documento implica o presidente do Congresso, o presidente da Câmara, dois ministros meus, você... Isso só pode ser contra mim".
O presidente disse que havia determinado pessoalmente a abertura de sindicância no BC. Quer apurar o responsável pelo "vazamento" dos dados da pasta. É a segunda vez que determina investigação do gênero em menos de um mês.
A outra foi aberta na PF (Polícia Federal) para apurar quem "vazou os diálogos do ex-chefe do cerimonial da Presidência da República Júlio César Gomes dos Santos captados a partir de "grampo" telefônico.
Antes de avistar-se com Fernando Henrique, ACM esteve com o ministro da Fazenda, Pedro Malan. Reclamou do "vazamento.
"Estou tão irritado quanto o senhor", disse-lhe Malan. "Vou apurar tudo."
Cheque da TV
Enquanto conversava com o ministro, o senador baiano recebeu um telefonema do filho. Luís Eduardo Magalhães havia obtido cópia de uma das listas armazenadas na pasta rosa. É o documento mais importante. Uma relação de supostas doações de campanha.
Menciona um cheque do Econômico à TV Bahia, de propriedade da família de ACM. O senador tem em mãos recibo da TV. O valor é equivalente ao do cheque.
O dinheiro refere-se, segundo diz, a pagamento de patrocínio do Econômico ao telejornal "Bahia TV", de alcance regional.
Abaixo, os principais detalhes da nova crise:
1) A pasta rósea foi encontrada em agosto, na sede do Econômico, em Salvador. Achou-a Francisco Flávio Barbosa, interventor do BC no banco baiano.
2) Há perto de 60 documentos na pasta. São três os principais:
a) fax da Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos) a Ângelo Calmon de Sá, ex-dono do Econômico. Nele estão 42 nomes de políticos afinados com os interesses da entidade;
b) relação de cerca de 40 políticos supostamente financiados pelo banco baiano. Nem todos os que estão na primeira lista aparecem na segunda, a mais importante;
c) cópias de cheques e notas fiscais de serviços e material de campanha que teriam sido pagos pelo Econômico.
3) A cúpula do BC foi informada sobre a pasta no início de setembro. Gustavo Loyola, presidente da instituição, avisou a Malan e a Fernando Henrique.
4) Os documentos foram trancafiados num cofre por Cláudio Mauch, diretor do BC. Apenas outros dois diretores sabiam de tudo: Gustavo Franco e Alkimar Moura.
5) Em sua edição da semana passada, a revista "IstoÉ" trouxe reportagem sobre a pasta. Não publicou documentos. Apenas informações sobre o seu conteúdo.
6) A revelação incendiou Brasília. No início da semana, as labaredas ardiam em segredo, nos bastidores. Desde quarta-feira, ganharam os jornais.
7) ACM mandou fax a Loyola. Desafiou-o a divulgar todos os documentos. Serra escreveu a Malan com o mesmo pedido. Krause discou para Loyola. Queria saber em que condições seu nome era mencionado. Recebeu cópia da papelada. Constava apenas da lista de candidatos preferenciais da federação dos bancos.
8) Começou-se a especular sobre quem seria o autor do vazamento. Cláudio Mauch foi eleito o suspeito número um. ACM e Serra, estrelas da pasta, são seus desafetos. Gustavo Franco e Alkimar Moura também são suspeitos.
9) Serra pediu a FHC a cabeça de Mauch. Informado, Loyola fez saber ao Palácio do Planalto que, se o auxiliar fosse sacrificado, pediria demissão em solidariedade. Em conversa com um amigo, Gustavo Franco insinuou que toda a diretoria sairia. "Aqui é na base do um por todos e todos por um", disse. O Banco Central acusa o interventor Flávio Barbosa.
10) Mencionado numa das listas, Sarney fez-se de morto. Queixou-se apenas nos subterrâneos. Disse que Fernando Henrique precisa controlar a Polícia Federal e o BC, sob pena de perder o controle sobre o governo.
11) Delfim Netto, também citado, acusa o BC de chantagear ACM, que investiga o caso Sivam e pressiona pela reabertura do Econômico. Delfim interpelou judicialmente o BC.

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sobre crise da pasta rosa à página 1-18

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