São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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Modernidade setentona

JANIO DE FREITAS

O mundo mudou. A queda do Muro de Berlim, o colapso geral do bloco soviético, a integração internacional em mercados comuns, a globalização, o mundo mudou com tudo isso. E o Brasil não pode ficar à margem, tem que mudar para incorporar-se à modernidade. A qual, nele, se traduz pela privatização das estatais, pela reforma da Constituição, reforma tributária, por um plano de estabilização e uma nova moeda. Tal é a modernidade que temos aprendido com o professor Fernando Henrique Cardoso.
Poderíamos ter aprendido antes, se contemporâneos do governo Arthur Bernardes ou se Domingos Meirelles escrevesse antes o livro "As noites das grandes fogueiras", que amanhã estará chegando às livrarias. É um levantamento precioso, e de leitura agradável, das circunstâncias institucionais, políticas, econômicas e sociais que envolveram a longa e desventurosa sucessão, nos anos 20, de levantes militares. Dos quais a Coluna Miguel Costa-Prestes, espinha dorsal da narrativa, foi a culminância.
E qual era, em l925, a "solução" dos problemas brasileiros cobrada pela Comissão Inglesa, antecessora, em nossa história, do FMI e do Consenso de Washington? Era a privatização do Banco do Brasil, do Lloyd Brasileiro, da Central do Brasil, de quantas estatais houvesse. O gênero da cobrança era muito adequado ao principal tema então em debate: a reforma da Constituição, dela retirando-se direitos ditos onerosos para o Estado. Reforma a ser seguida, segundo as promessas eleitorais de Washington Luiz, por um plano de estabilização com lançamento de nova moeda (já seria o cruzeiro, nascido muito depois). Não faltava nem sequer a discussão em torno do imposto único, dado como razão de ser da reforma tributária.
Foi uma justa coincidência que fez a "modernidade" do atual governo introduzir-se em l995: vale como comemoração dos seus provectos 70 anos.
Lei do silêncio
O guru de Fernando Henrique Cardoso é Rubens Ricupero, cuja orientação ética o presidente segue à risca.
Recebida de Francisco Graziano a transcrição do "grampo" que apontava para tráfico de influência no próprio gabinete presidencial, Fernando Henrique trancou-o na gaveta ou na memória. O assunto só produziu alguma consequência porque tornado público, bem mais tarde, pela imprensa.
Sabe-se agora que Fernando Henrique foi informado há mais de dois meses sobre a pasta cor-de-rosa encontrada no Banco Econômico, com nomes de políticos que teriam sido financiados, na campanha eleitoral de 90, pelo banqueiro Ângelo Calmon de Sá. Fernando Henrique trancou o assunto na memória ou na gaveta, até que, outra vez, a imprensa o tornou público.
É a máxima de Rubens Ricupero elevada da parabólica para a Presidência da República: "O que é bom a gente mostra, o que é ruim a gente esconde".
Em baixa
Entre o desagrado com a demissão do ex-ministro Mauro Gandra e o noticiário a cada dia mais prejudicial ao conceito da Aeronáutica, é difícil distinguir, se é que existe, o fator de maior peso na exaltação da oficialidade superior da FAB.
A não ser no movimento dos sem-terra, não há onde o conceito do governo Fernando Henrique, se não o do próprio, esteja mais baixo do que na Aeronáutica.
Reforma
Pasta rosa era, ou ainda é, produto de limpeza. Agora é sujeira.

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