São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 1995
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Entre o direito e o preconceito

Cientista político e geógrafo discutem fronteiras

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Não houve limites temáticos no debate sobre "fronteiras" entre o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro e o geógrafo Milton Santos, ambos professores da USP. Os dois vasculharam vários tipos de fronteiras, sejam aquelas entre os países, sejam aquelas mais difíceis de enxergar entre classes sociais.
O debate foi o último do ano da série "Diálogos Impertinentes", promovidos pela PUC/SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e pela Folha. O debate teve mediação de Caio Túlio Costa, diretor-executivo da Folha Online, e Mário Sérgio Cortella, do Departamento de Teologia da PUC.
Logo na primeira pergunta, Cortella já deixou claro o que "fronteiras" podem representar -uma "negação da idéia de humanidade".
As respostas mostraram que fronteiras não são apenas isso. Elas podem ser necessárias, como as de uma reserva indígena, para evitar que invasores prejudiquem os índios, disse Pinheiro.
"A fronteira da privacidade, a fronteira da proteção dos direitos, eu acho uma graça enorme. Agora, a maior parte das fronteiras, as do racismo, da discriminação, do preconceito, eu acho absolutamente detestáveis", disse Pinheiro.
Outros desses limites "absolutamente detestáveis", para ele, são aqueles que a Europa ou os EUA aplicam ao Terceiro Mundo. Mas terceiro-mundistas, como os brasileiros, também têm as suas -como as "fronteiras" impostas em São Paulo aos nordestinos ou em relação aos "não-brancos", declarou o cientista político.
Santos lembrou o decreto assinado pelo presidente Fernando Henrique no último dia 20 de novembro, data da morte do líder negro Zumbi há 300 anos. "É um decreto bobo, cerimonial, que promete coisas sem data, condena sem propor sanções, sugere sem alinhar objetivos".
Para Santos, sem políticas compensatórias completas, nada mudará. Dar vaga a um negro na universidade, sem atacar suas carências, poderia ser contraproducente. "Então, se dirá, como hoje nos EUA, que os negros são realmente incapazes, que não há porque ajudá-los porque eles não aproveitam as oportunidades", disse.

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