São Paulo, quarta-feira, 13 de dezembro de 1995
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Botafogo fará final carioca

CÉSAR MAIA
ESPECIAL PARA A FOLHA

A Folha inaugurava sua gráfica. A mesa de ministros saboreava futebol, e Pelé autografava para o ministro mexicano.
As semifinais tinham sido decididas no dia anterior. A pergunta quicou na mesa e a resposta veio de bate-pronto.
Pelé e eu dissemos juntos: "Botafogo e Santos."
Falamos olhando para o passado. Pelé jogava, eu torcia. Botafogo x Santos não era jogo, era ópera, com direito a tenores e barítonos como Pelé e Garrincha, Didi e Mengálvio, Amarildo e Coutinho, Quarentinha e Pepe, Mauro e Nílton Santos.
Anos 60 de Pelé e Garrincha, de Tom Jobim e João Gilberto. Da nova bola e da bossa-nova. Três Copas, de 58 a 70. Tudo em preto e branco. Tudo em branco e preto. O ditador podia tudo. Aliás... quase tudo. Só não podia escalar a seleção. Dadá aguardaria a vez.
Voltamos a 95: Pacaembu e Morumbi em obras. Telefonei à Federação Paulista: "Vamos fazer a final do Paulista no Maracanã?". A resposta não esperou: "Isso é idéia de maluco!".
Era, na verdade, uma idéia Santos demais, carioca demais. O Maracanã é o estádio santista. Sem dúvida, o Santos sempre foi carioca. É no Rio que está sua torcida... e sua glória. Como no dia em que, grama encharcada, Amarildo no Milan e Almir no Santos, o Maracanã suava gente. Todos nós fomos campeões do mundo.
Privilegiados os que viram o futebol em preto e branco. Zagallo cruza em diagonal pelo alto. Quarentinha, fora da área, toca a bola com o peito para cima e voa numa meia bicicleta.
Todos parados. Menos a bola, dentro do gol.
Aloísio, roupeiro, gritava: "Descobri! A tabelinha de Pelé e Coutinho depende das meias brancas, eles só olham para os pés. Vamos jogar de meia cinza."
Duas horas depois, saímos do Maracanã com cinco manchas brancas.
Botafogo e Santos eram produtos da alegria e da criatividade de nosso povo. E como elas não combinavam com ditadura, há quem diga que o AI-5 foi baixado contra o Botafogo, logo após os títulos de 67-68.
Depois, foram quase 20 anos aguardando a democracia. Que voltou. Custou, mas chegou. Resgatou nosso futebol em branco e preto. O resultado é fácil: ganha o torcedor, ganha o futebol. Uma final carioca!

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