São Paulo, sexta-feira, 15 de dezembro de 1995
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Justiça social, enfim

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO - Ufa, começa enfim a se delinear uma política social digna desse nome para o país. Refiro-me à proposta para que os bancos deixem de pagar IR (Imposto de Renda).
Nada mais justo. Meu coração fica em frangalhos ao ver a quantidade crescente de banqueiros pedindo esmolas ou vendendo balas nas esquinas.
A única coisa a criticar na idéia é o seu caráter tardio. Afinal, todo o mundo sabe que, nos tempos de superinflação, os banqueiros cansaram-se de perder dinheiro.
Aliás, deve estar ainda na memória coletiva o confrangedor espetáculo de Ângelo Calmon de Sá, no dia da intervenção em seu Banco Econômico, ver-se obrigado a admitir que sacara miseráveis R$ 10 mil para passar o fim-de-semana.
Coitadinho. Mesmo o cidadão de hábitos mais frugais, quase monásticos, teria dificuldade em sobreviver um só dia com R$ 10 mil. Quanto mais todo o fim-de-semana.
Critique-se ainda o fato de a redução do IR ser insuficiente para atender o drama social dos banqueiros. Se o governo quiser mesmo justificar seu caráter social-democrata deveria obrigar o Betinho a distribuir cestas básicas para eles.
Claro que haveria limites. Digamos, uma cesta apenas para cada um dos três sócios principais de cada banco. Claro que não vai resolver o problema, mas, enfim, o país tem outras carências, certamente não tão graves.
Por exemplo, os parlamentares. Essa classe, em um gesto digno de seu nunca assaz louvado desprendimento, decidiu manter a própria aposentadoria nos humilhantes termos atuais. Ou seja, precisarão trabalhar intermináveis oito anos para ter direito a uma miséria de R$ 2.000 como aposentadoria.
Que país injusto. Esse pessoal trabalha em condições que lembram os piores tempos prévios à Revolução Industrial, com jornadas que, por vezes, se estendem ao longo de três dias por semana. E ainda vai precisar de oito anos seguidos para poder se aposentar.
É claro que a maioria não conseguirá atingir o tempo necessário para o digno e merecido ócio.
Mas, como o presidente prometeu que sua gestão seria a de refundação da República, os alvissareiros fatos descritos devem fazer parte apenas dos primeiros pilares. Que alívio.

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